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Chorando de alegria
Texto de Thich Nhat Hanh,
extraído do livro"Flamboyant em chamas"

Nunca antes a flauta tinha ressoado tão alegre, mas, ao mesmo tempo, tão calmamente. T’ô tinha a impressão de flutuar qual uma nuvem. Uma nuvem flutuando numa brisa e nos raios de sol. Um instante mais tarde, a floresta toda flutuava com T’ô e ambas formavam imensa nuvem. A flauta de T’ô era uma grande nave trazendo a primavera. T’ô esqueceu a cegueira. Esqueceu também que o pai tinha morrido. Ela tinha voltado à sua fonte. Corria sobre a colina, a mão na do pai e ambos riam alegremente. Só existia agora o riacho, cantando como raios de sol na primavera e também o gorjeio dos passarinhos caindo como pérolas. Ela somente ouvia o urgente apelo de amor da flauta, das colinas, do mundo vegetal, um grito tão familiar quanto o da mãe chamando para entrar em casa e lavar os pés numa grande bacia d’água antes de entrar, acender uma lâmpada e sentar-se para jantar. Thach Lang estava sentado quieto escutando a flauta de T’ô. Mas ela sentiu as lágrimas que corriam de novo e pensou que ele devia tê-las visto. Parou de tocar, recolocou a flauta no colo e, erguendo um canto de sua camisa branca bá-ba, enxugou os olhos. Depois sorriu. Entretanto, Thach Lang permanecia silencioso. T’ô pensou que ele deveria estar tão feliz quanto ela. Disse então:

— Estou chorando, mas não estou triste, mano Thach Lang. Estou feliz!

Finalmente Thach Lang perguntou:

— Por que você nunca tinha tocado músicas tão alegres antes? Eu ouvi você tantas vezes tocar uma canção muito triste.

Porém, T’ô, ao invés de responder, perguntou:

— Mas onde estava você, quando me ouvia tocar?

— Estava no alto da montanha, lá em cima. Todos os dias a música de sua flauta chegava até lá.

— A que distância é o cume da montanha? Como pode o som da minha flauta ir tão longe?

— Oh! Esse som pode até mesmo alcançar as nuvens! Todos os dias, podia claramente ouvi-la tocar.

Agora que Thach Lang tinha falado algumas palavras mais, T’ô podia visualizar mais claramente aquele que tinha se tomado o seu novo amigo. Na escola, na Aldeia do Alto, T’ô havia tido muitos amigos, meninos e meninas, mas nenhum deles era como este Thach Lang sentado perto dela. Sentia que ele era taciturno, mas não tímido. Embora não fosse expansivo, estava certa de que ele era sensível e sério. Ela não sabia por que, mas tinha certeza de que ele nunca tinha ido à escola e de que não havia tido amigos antes. Devia ser a primeira vez que saía de casa e descia de sua montanha. Enquanto ela estava pensando em tudo isso, Thach Lang falou:

— Sabe, eu ouvi sua flauta e, então, vim. Levei dois dias para descer até aqui.

— Dois dias! Nesse caso a casa dele devia ser longe, muito em cima da montanha! T’ô nunca tinha imaginado que os sons de sua flautinha pudessem viajar tão longe. Sua flauta, então, tinha-lhe realmente encontrado um amigo! E este novo amigo era como uma folha de papel imaculada sobre a qual não havia nenhuma letra, nenhuma linha, nenhuma pauta. Era estranho, mas, sentada perto de Thach Lang, T’ô quase não ousava mexer: ela tinha muito medo de trazer um som discordante no universo de ambos. Não ousava nem falar nem rir às gargalhadas como o fazia com os colegas de escola da Aldeia do Alto. Não era por ter medo de Thach Lang. Não. Mas sentia respeito por ele. Ela o respeitava como se ele fosse uma folha de caderno novo quando a gente o principia. Não queria escrever ou desenhar algo em cima sem o máximo cuidado. Por isso, permaneceu tão quieta quanto ele. Ele devia estar entendendo isso, pois T’ô ouviu-o dizer:

— Por favor, maninha T’ô! Diga-me como é aqui, embaixo da montanha?

— T’ô começou a falar de seus pais e de sua vida na choupana, na encosta da colina. Falou de sua escola, da professora, da praça e das pessoas da Aldeia de Baixo.




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