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INTRODUÇÃO AO DZOGCHEN
Uma visão do Dzogchen através dos textos
Este é um trabalho de seleção e ordenação de textos
de vários autores e mestres dzogchen por
Karma Tenpa Darghye.

Qual é o significado do termo "grande perfeição" ou grande "consumação", como Dzogchen é, às vezes, traduzido? O que é que chamamos de perfeito, consumado, completo? A verdadeira natureza da mente é uma pureza original — completa em si mesma, não precisando ser incrementada por qualquer modo. Quando tentamos olhar para a mente, não conseguimos encontrar nada. Uma pessoa à qual falta visão não irá descobrir nada, e tampouco irá um ser iluminado. Não obstante, tudo o que se manifesta é a atividade, o jogo da mente, por nenhum modo separado da mente, do mesmo modo que as ondas não são separadas do mar.

Dentro da natureza da mente samsara e nirvana estão completos. A própria iluminação não está além dessa natureza. Esse estado completo — que inclui todo o samsara, o nirvana, a própria iluminação — é o âmbito da grande_perfeição. O chen de dzogchen significa "grande", no sentido de que todos os seres de todo o universo das três mil dimensões possuem essa pureza original, completa.

Se a verdadeira natureza da mente é completa ou perfeita, por que sofremos? Seguimos o caminho da grande perfeição porque não enxergamos a nossa perfeição. Como o calor derrete o gelo, nossa prática dissolve as aparências sólidas de realidade que obscurecem a nossa natureza essencial, tornando completamente óbvias as verdadeiras qualidades da mente.

Portanto, o fundamento da grande perfeição é essa grande consumação. O caminho é o processo de remoção daquilo que obscurece a natureza fundamental da mente. E o fruto é a realização plena dessa natureza fundamental, quando inteiramente revelada.

Na abordagem da grande perfeição, visto que o caminho é forjado a partir da própria consciência intrínseca primordial, precisamos diferenciá-la da mente ordinária. Nossa consciência intrínseca no momento presente, livre de recordações ou pensamentos ordinários, de artifícios ou fabricações, é ela própria Dharmakaya, a intenção iluminada da pureza original. Isso nos é apresentado diretamente, na experiência imediata da nossa verdadeira natureza, como sabedoria ou consciência primordial que ocorre por si só. Para além dos três tempos do passado, presente e futuro, fazemos uma constatação no momento imediato dessa experiência.

Surgindo por si só e liberando-se por si só, como ondas que se dissolvem de volta no mar, as recordações e pensamentos dissolvem-se no terreno do ser, sem deixar vestígio. Ganhamos confiança interior diante da experiência imediata dessa liberação. [...]

Precisamos combinar a visão mais elevada com uma ação impecável. Então, a nossa prática se torna infalível. Podemos falar sobre natureza búdica e vacuidade, mas, se não tivermos tido realização delas, apenas nossas palavras não produzirão transformação. Precisamos ser muito honestos sobre nossa capacidade. Se somos uma raposa, não devemos pensar que podemos pular a mesma distância que um leão, ainda que possamos enxergar o alvo. Se não tivermos realização profunda da verdadeira natureza da realidade, precisamos ser extremamente cuidadosos com nossas ações. Não podemos descartar nossa experiência relativa pensando que ela não importa, já que tudo é vazio. Precisamos ficar atentos a ela até que alcancemos a iluminação.

Como praticantes, somos muito jovens, como crianças no jardim da infância. Não devemos beber veneno, quer a natureza desse veneno seja vazia ou não. Podemos ser estudantes da grande perfeição, mas, se nossa compreensão for incompleta, se nossos pensamentos, fala e ações forem negativos, ainda vamos estar criando carma negativo; a grande perfeição não irá nos liberar. Iremos apenas ficar mais profundamente enredados no samsara. Até que venhamos a alcançar realização estável, tudo o que fazemos, pensamos ou dizemos conta. O grande mestre Padmasambava disse, "Em minha tradição, a visão do praticante é tão elevada quanto o céu, e as suas ações tão refinadas quanto farinha de cevada".

Agir com muito cuidado, meditar e manter a visão trazem maturidade para nossa prática e aceleram nosso progresso no caminho. Shantideva disse que, se conhecermos diretamente a verdadeira natureza da mente e mantermos esse conhecimento, todas as experiências dualistas serão conquistadas e todos os venenos da mente serão purificados. Se a sua prática for ótima, você notará mudanças dia após dia. Se sua prática não apresentar esse grau de eficácia, mudanças estarão aparecendo a cada semana, cada mês ou cada ano. Se não ocorrer nenhuma mudança, mesmo após anos de meditação, o erro estará na qualidade da sua prática. Você não poderá pôr a culpa no Dharma.

Hoje em dia, embora muitas pessoas falem sobre grande perfeição, o nível de realização não é o mesmo de antigamente. É menor o número de praticantes que conseguem o corpo de arco-íris, a dissolução dos elementos do corpo em luz, quando a iluminação é alcançada. As pessoas dizem estar praticando a grande perfeição e, no entanto, sequer alcançaram as metas básicas de reduzir raiva, apego e ignorância.

O problema não está nos ensinamentos. Nem houve qualquer ruptura na linhagem mente-a-mente. O fato é que os praticantes não são diligentes. Uma pessoa não pode simplesmente escolher um ensinamento, praticá-lo na medida em que desejar, e ignorar o resto. As coisas não funcionam assim. É essencial que a pessoa persista em seus esforços desde a base inicial até a conclusão.

Podemos receber grandes ensinamentos e métodos, mas, se não fizermos uso deles, seremos como alguém juntando dinheiro que não irá transpor o umbral da morte — estaremos apenas desperdiçando o nosso tempo. Se praticarmos a grande perfeição com diligência, poderemos atingir a iluminação em sete anos ou, com maior diligência, pureza e receptividade, em três anos ou mesmo em apenas um. Sem essas qualidades, podemos ficar em retiro por dezesseis ou trinta e dois anos, nossa mente correndo de um lado para outro, sem nada alcançar. A casa em que fizermos o nosso retiro parecerá apenas uma prisão. Ou podemos praticar em meio às atividades do mundo, direcionando a mente para o Dharma, repousando na consciência intrínseca a cada momento do dia, e alcançar a iluminação nesta própria vida.

Embora ciente de que são ilusórias, o bodisatva se propõe a fazer meditações que demandam esforço e a praticar atividades benéficas, visando ajudar aqueles que vivem aprisionados por acreditarem na aparente solidez de sua realidade. Isso leva ao fruto do caminho: a revelação integral da nossa natureza fundamental, a grande perfeição que tudo abarca. Por meio da realização plena da visão, meditação e ação, atividades positivas surgem espontaneamente.

Do livro: PORTÕES DA PRÁTICA BUDISTA – Chagdud Tulku Rinpoche




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