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O que é o Budismo?
Ryotan Tokuda Igarashi
Palestra proferida em Buenos Aires,
para um grupo de psicólogos,
de 19 a 23 de outubro de 1983


Caros amigos, para encerrar este ciclo de palestras, hoje à noite eu vou falar sobre o Budismo Zen. O Budismo Zen começou na Índia com o Buda Gautama e, até o meu mestre, houveram oitenta e quatro patriarcas. Esta disciplina e ensinamento foram transmitidos através de mestre e discípulo, pela Índia, China e Japão, agora nós estamos aqui na Argentina. A escola Zen é considerada como o Budismo transmissão correta, uno e puro, porque não é realizada através de leituras ou livros, mas é transmitida fisicamente com o mestre e discípulo se encontrando face a face e transmitindo o Dharma de coração para coração. A palavra Buddha significa literalmente homem iluminado, homem desperto. Quando o Buda Gautama atingiu a iluminação embaixo da árvore sob a qual meditava ficou muito feliz, durante uma semana inteira ele ficou naquele estado de muita felicidade. Depois surgiu uma dúvida: eu encontrei esta resposta com muita dificuldade, mas será que alguém vai ser capaz de compreender os meus ensinamentos? Todo mundo está dormindo e tem os Três Venenos: o apego, a raiva e a ignorância. Assim, mesmo que eu for ensinando por aí, ninguém vai entender. Este foi justamente o primeiro perigo da vida de Buda, e nesse momento ele despertou aquela grande compaixão: se eu falar, talvez algumas pessoas entendam, pois algumas pessoas têm somente uma fina camada de poeira nos olhos; essas pessoas serão capazes de compreender a doutrina.. Jesus Cristo também teve estas mesmas tentações no deserto antes de começar o seu ensinamento. Aqui é onde se mostra a diferença entre o mundo comum, profano, e o mundo sagrado. Quando o Buda Gautama viu uma pequena lagoa, várias flores de lótus estavam embaixo da água, outras estavam no mesmo nível da água e algumas estavam acima e fora da água. Então ele compreendeu: se eu falar, algumas pessoas vão entender, tal qual o sol que doura os lagos cobertos de lotus e vê quais os botões que estão próximos a se abrirem a seus raios, e quais os que não saíram ainda das suas raízes. Esta sensação de solidão no Caminho dos mestres, todos eles já percorreram esta trilha.

Um sapo começou a viajar e chegou a uma outra lagoa muito distante, mas nesta lagoa moravam sapos dotados de um só olho. Eles diziam: ah, este tem dois olhos, é um aleijado. Para nós é uma coisa muito clara, nós temos dois olhos, mas se a gente encontrar um mundo em que todos tenham apenas um olho, nós estamos errados. Isto significa que nós temos percepções limitadas. Por que existe o sofrimento? Viver é sofrimento, doença é sofrimento, envelhecimento é sofrimento, e finalmente a morte é um sofrimento. A separação daqueles a quem amamos é sofrimento, encontrar com aquelas pessoas a quem odiamos também é sofrimento. Quando queremos ganhar uma coisa, e não conseguimos, sofremos. E, finalmente, viver com saúde também é sofrimento,  porque  temos desejos para comer, dormir, sexo, fama, poderes e bens materiais. Então por quê  este sofrimento? Porque tudo é impermanência. Nós queremos que as coisas durem, mas elas são impermanentes, mudam constantemente.

Um dia a pessoa começa a procurar religiões. Por quê? Para viver nós precisamos de comida todos os dias, mas a cultura por exemplo, algumas pessoas podem viver sem ela. Para certas pessoas não se pode viver sem cultura, como literatura, pinturas, ou músicas bonitas; sem isto não se pode viver. Agora eu pergunto: e quanto à religião? Algumas pessoas não precisam, mas algumas pessoas, talvez poucas pessoas, precisem. Uma pessoa viajava, de repente encontrou um tigre. Então fugiu para o outro lado, aí encontrou outro animal, um urso, uma onça, um outro animal muito perigoso. Aí descobriu um poço profundo e entrou dentro deste poço segurando numa corda. No fundo do poço havia um jacaré esperando, de boca aberta. Exatamente esta situação é a nossa vida, não tem jeito de escapar destes perigos.

Uma pessoa estava segurando com as duas mãos um cipó trançado sobre um abismo e aí apareceram dois ratos, um branco e um preto, e começaram a comer aquele cipó. A pessoa começou a ficar desesperada, mas de repente ela encontrou na beira do precipício uma flor muito bonita que deixava cair um néctar doce, "ah que gostoso", e começou a beber o néctar que caia em cima de sua língua e assim esqueceu todos aqueles perigos. Exatamente nós estamos vivendo neste mundo sem saída, condenados à morte com o passar dos dias e das noites, mas este mundo tem muita coisa divertida. Hoje em dia os japoneses dizem: três S; o primeiro S é speed, velocidade. O segundo é o sexo, e o terceiro é o suspense. Os jovens usam speed (droga, ou sexo) e assim esquecem todos os perigos e impermanências, não há outro mundo, então porque não viver neste? Falando dessa forma, muitos materialistas vivem como querem e bem entendem. Os jovens estão procurando pelo Caminho, sem saber onde ele vai. Estão como que dormindo ou bêbados, sonhando dentro de um sonho, precisam uma vez pelo menos despertar. Algumas pessoas têm muita dificuldade de perder o valor que as coisas representavam para elas. Até ontem, ele dava muita importância para a casa ou para a esposa ou o marido, mas de repente perde tudo. Com as guerras, a pessoa pode perder o seu filho ou marido, com um incêndio sua casa pode ser destruída. Com esta inflação, o dinheiro também não vale mais nada. Então estas coisas começam a cair e a pessoa se sente insegura, porque deseja uma coisa segura e certa.

O que podemos segurar? Exatamente por isto foi que o Buda começou a pregar o seu ensinamento. Para quebrar as percepções distorcidas. A escola Zen coloca algumas perguntas paradoxais. Por exemplo: as montanhas verdes estão sempre se movendo e uma mulher de pedra dá a luz de noite. Falando dessa forma ninguém entende, e então as pessoas dizem: isto não pode ser compreendido pelo intelecto. Mas não é isto. Podemos entender isto com o intelecto sim.

Não são somente as montanhas que estão se movendo, mas é a Terra também que está a se mover. Antigamente as pessoas pensavam que o Céu ou o Sol é que estavam se movendo e a Terra não. Hoje em dia, até crianças do grupo escolar sabem que não é o Sol, mas a Terra que está se movendo, como Galileu Galilei, ou como Copérnico descobriram. Da mesma maneira, um cientista estava vendo o mapa mundi, de repente descobre que se aproximassem os continentes da África e da América do Sul, eles se encaixavam perfeitamente. Então ele percebeu que a América do Sul estava ligada à África e também à Europa, e que não havia o Oceano Atlântico, há muito tempo atrás. Aquelas ilhas do Havaí, a mesma coisa também aconteceu com elas. Há muitas ilhas surgindo no Havaí hoje em dia, porque as lavas dos vulcões formam uma ilha, aí a ilha formada começa a impedir a saída de mais lava, então a lava empurra esta ilha e ela se desloca, passa para outro lugar, e então a lava forma uma nova ilha. Uma a uma, vão aparecendo todas aquelas ilhas do Havaí. Se você declarar para um peixe, a sua casa está correndo sem parar, ele vai se assustar. Talvez ele diga, não brinca comigo, a minha casa sempre esteve firme aqui. Toda a nossa percepção sobre o mundo é limitada. Mas porque é que isto acontece? Porque nós temos a idéia de ego, o egocentrismo. Esta idéia de ego funciona constantemente, mesmo que a pessoa esteja dormindo ou em estado de coma, esta idéia já está na inconsciência. Principalmente quando uma pessoa está próxima da morte, aparece o apego a este corpo, o apego a este ambiente material, ao que a pessoa julga lhe pertencer. Não é somente a casa ou o carro, mas a família, o marido, filho e também experiências e sabedorias. Até à vida futura a pessoa tem apego. Esta é a nossa realidade, mas ninguém pode acompanhar quem está morrendo, a pessoa que está morrendo tem que ir sozinha. Então, precisa quebrar esta idéia de ego, por isto a prática Zen diz: o treinamento de Zen é aprender sobre si mesmo. Aprender sobre si mesmo significa esquecer de si mesmo. Esquecer de si mesmo significa limpar a idéia do ego. Limpar a idéia do ego é tornar-se a própria Verdade. Assim, quando se diz que uma montanha verde está sempre se movendo, a pessoa se assusta mas quando pensa um pouco mais, não são somente as montanhas, até a própria Terra está se movendo. Quem não conhece este movimento das montanhas verdes, não conhece o movimento de si próprio. Porque acontece isto? Nós temos lembranças, desde a infância e mesmo antes dela. Então, dentro de mim, alguma coisa, aquela idéia de identidade está continuando. Mas há vinte, trinta anos atrás eu era outro, era um menino pequeno. Hoje, e depois no futuro, daqui a vinte ou trinta anos, vou ficar mais velho e aí sou outra coisa. Assim, cada momento está mudando, mudando sem parar. Quando acendo uma vela, esta continua acesa. Parece que a chama é sempre a mesma, mas não é. Quando você chega perto da chama ela está fazendo um barulho de dzzz, dzzz que está continuando e por isto nós estamos enganados em pensar que  existimos para sempre.

Um senhor ficou muito velho, ele era milionário e tinha muitas mulheres, mas estava perto da morte. Ele disse para a primeira mulher agora eu vou morrer, me acompanha junto na morte. Não!! Absolutamente não! Até agora, nós sempre vivemos juntos, por isto eu vou até o cemitério com você, mais do que isto eu não vou, disse ela. Aí ele falou para a segunda mulher: eu te amei muito, por isto você pode me acompanhar na morte. Não, até dentro do caixão eu vou, mas mais nada, falou a segunda. Disse para a terceira mulher que era a mais jovem e a mais bonita, eu amei você de uma forma muito especial, você podia me acompanhar na morte. Mas também esta mulher disse que não, ora, a primeira e a segunda mulher recusaram, porque é que tenho que ir? Ele tinha a quarta mulher, esta era quase como uma empregada, como uma escrava. Bom, eu te maltratei e não posso te pedir muito, mas você me acompanharia? Aí ela disse: claro que eu vou. Onde é que você vai? Agora eu pergunto: O que é que são estas mulheres? A primeira mulher talvez sejam os bens materiais, móveis, cama, espelhos, mesas e coisas assim, isto pode ir até a morte, mas depois não pode mais ser usado. Agora, a segunda e terceira mulheres talvez sejam a fama, títulos, estas coisas que podem acompanhar a pessoa até que ela entre dentro do caixão, o homem continua com a fama dentro da caixão. A quarta mulher simboliza o Karma, aquilo que você fez na sua vida em ações, palavras e pensamentos, isto vai acompanhando a pessoa até o fim. Os Budistas pensam da seguinte forma: não é Deus que manda você ao céu ou ao inferno, mas são os seus próprios atos, com a lei de causas e efeitos, que fazem com que você caia no inferno ou no paraíso.

Podemos dizer que quando nascemos, junto conosco nasce um Deus, e este Deus está sempre nas nossas costas. Qualquer coisa que eu faça, de bem ou de mal, este Deus anota tudo. E quando nós morremos, ele começa a contabilizar nossa vida com um computador, ele tem um espelho como se fosse uma televisão e nele se mostra tudo aquilo que a pessoa fez na vida, uma espécie de videocassete, no qual já está tudo gravado. Já imaginaram, nós todos vendo aquilo que fizemos durante a vida? É realmente uma coisa horrorosa. A gente pode enganar a outras pessoas, não mostrar, esconder, mas àquela lei de causas e efeitos, ninguém escapa. É desta forma que a montanha verde está sempre se movendo.

Isto é a impermanência, nós estamos mudando, mudando, e por isto não existe nada em que possamos nos segurar. Talvez existam dois tipos de religiões: a primeira é como se segurar numa coisa, como se fosse um apoio, um encosto. No outro tipo de religião, não tem nada para se segurar, não há nada para se agarrar, por isto mesmo é que tudo é vazio, por isto está tudo tranqüilo.

Esta idéia de vazio, do nada, é a filosofia fundamental do Budismo. Muitos místicos cristãos também falam no nada, como Maister Eckhart, ou São João da Cruz, que fala sobre a noite escura. Então uma montanha verde está sempre se movendo, e uma mulher de pedra dá a luz de noite.

Nós precisamos mergulhar para nos encontrarmos conosco mesmo, naquela noite escura do espírito. Quando uma pessoa quer ter aquela experiência religiosa, ela precisa ter uma preparação. Rezar, afastar-se dos demais e começar a meditar em silêncio. Dentro de qualquer religião nós podemos encontrar aquele silêncio bem profundo, através deste silêncio é que começamos a nos preparar para uma purificação, para poder chegar até aquele estado místico. Como disse São João da Cruz: a noite dos sentidos, a noite do espírito, a noite da alma. Através desta viagem interna começamos a nos afastar do mundo exterior e começamos a trabalhar sobre o mundo interior, mergulhando, mergulhando dentro da nossa subconsciência, da inconsciência. Quando chegar ao fundo desta escuridão, há aquela união com Deus, com o amor. Para esta experiência, a escola Zen coloca uma palavra, a Iluminação, o satori. Este estado, um mestre o expressou da seguinte maneira: numa noite escura, quando escuto a voz do corvo sem cantar, tenho saudades do meu pai antes que eu tivesse nascido. Este verso mostra aquele encontro no fundo com o verdadeiro eu, a união com Deus. Numa noite escura, totalmente escura, não dá para ver nada, escuto a voz do corvo sem que este cante. O corvo é um pássaro preto, dentro da escuridão não se vê nada e ainda por cima, ele está sem cantar. E quando escuto a voz do corvo sem que ele cante, tenho saudades do meu pai antes que eu tivesse nascido. Pai é masculino, não tem aquela força de fazer nascer, só a mulher é que pode fazer isto. Mas quando escuto a voz do corvo sem que este cante, tenho saudades do meu pai. Esta experiência é muito especial, é uma coisa sagrada, uma coisa para nós seres humanos. Nos discursos de grandes místicos cristãos, podemos encontrar vários tipos de expressões parecidas. Eles falam sobre essa dificuldade de expressão: inefabilidade, difícil de expressar com palavras. Mas quando há aquela experiência, aquela felicidade, aquela alegria, a pessoa não pode manter-se calada, tem que procurar transmitir aquilo para os outros. O estado do êxtase, a dificuldade de expressão é momentânea, mas é muito forte e muito marcante, e, mesmo assim, os sábios não ficaram calados e sempre começaram a falar para outras pessoas; felizmente isto foi transmitido até hoje através de seus sermões e atos.

Neste caso, não há nenhuma diferença entre o Oriente e o Ocidente. Apesar de haver países diferentes e línguas diferentes, culturas diferentes, estamos falando do mesmo estado: Quando a pessoa tem essa experiência mística e começa a expressá-la em palavras, é aí que aparecem as diferenças, porque cada pessoa é educada e criada em certa cultura e com certa religião. Por isto, quando a pessoa tem esta experiência e começa a se expressar, usa palavras e termos dos quais ela teve experiência e nos quais ela viveu. Naturalmente assim, ela usa as palavras do Cristianismo ou do Budismo ou do Hinduísmo, etc. Hoje em dia já se iniciou um intercâmbio entre o Cristianismo e o Budismo, especialmente o Zen. No ano passado sessenta monges Zen foram convidados para ir à Alemanha, para praticar meditação junto com os Freis Dominicanos.

O que importa é esta experiência fundamental, através da meditação ganhar sabedoria. Esta não é uma sabedoria deste mundo; não importa se a pessoa é doutor, médico, advogado, etc. Isto não quer dizer sabedoria, apenas conhecimento. A sabedoria deste tipo de experiência vê uma outra dimensão deste mundo. Atravessar para mais além destas percepções limitadas, mas como? Quando tiver esta experiência da escuridão total, a pessoa faz uma limpeza total do egocentrismo. Este trabalho é de certa maneira muito doloroso, porque nós temos muitos apegos, muitas ignorâncias.

É necessário limpar isto tudo completamente, através da meditação. A meditação está sempre ligada com a sabedoria. Há quatro tipos de sabedoria: a primeira sabedoria é a sabedoria de um espelho redondo e grande, sendo o tamanho dele o universo inteiro. Ele reflete todos os fenômenos deste mundo, um espelho muito antigo. De madrugada, uma senhora cega e de idade encontrou com este espelho. Então, o que é que acontece? O espelho refletiu exatamente aquela senhora idosa e cega, mais nada.

Mas isto é difícil de entender, porque nós temos discriminação ou apego. Se aparecer uma moça bonita, aí sim, que bom, quando ela vai indo embora ah, não vai não. Quando o contrário acontece, isto é, a moça é feia, então não desejamos que ela fique. Mas o espelho nunca faz esta discriminação. O espelho simplesmente reflete tudo aquilo que aparece.

O espelho reflete quando aparece a senhora de idade ou a moça, porque para ele não faz a menor diferença, isto significa que cada presença que aparece em frente ao espelho é absoluta, eterna e perfeita. Quando não fazemos discriminação de qualidade, cada pessoa está perfeita, assim mesma como ela está. Nós nascemos carregando todos aqueles Karmas de vidas passadas e podemos mudar de vida, o presente e o futuro e até o passado, mas o que se recebeu até agora, ser de naturalidade argentino, brasileiro, japonês, isto não pode ser mudado nunca, este é o nosso Karma.

Mas, isto não importa, a única coisa que posso fazer é aceitar isto, viver isto com a minha responsabilidade total. Quando eu encontrar dificuldades, problemas, sofrimentos, é porque estou pagando o meu Karma. Se a pessoa pode entender isto, o sofrimento não é mais sofrimento, é muito simples. Por isto, cada um de nós que está aqui presente, está vivendo totalmente perfeito. O Budismo diz: nós somos Buda originalmente, mas nós estamos perdidos, bêbados e dormindo, como se estivéssemos gritando de sede no meio da água.

Um monge perguntou para o mestre: mestre, por favor, me ensine o segredo do Budismo. Ah, sim, mas hoje tem muita gente, quando não tiver mais ninguém eu vou te ensinar, disse o mestre. No dia seguinte, o monge chegou de novo: mestre, não tem mais ninguém, me ensine agora. Ah, vem cá, e foram para o jardim. Aí o mestre disse: está vendo? Esta árvore é alta e esta outra árvore é baixa. Este é que é o segredo do Budismo.

Não há nenhum segredo, tudo está aberto, transparente e está na frente de todo o mundo, mas o problema é que as pessoas fazem diferenças, se isto é alto então isto é bom, essa árvore é grossa então posso vender mais caro, esta outra árvore é baixa e feia e não vale nada, são as pessoas que fazem diferença. E tudo isto é Karma que está aparecendo. Dessa forma, este tipo de sabedoria reflete o que aparece na frente da pessoa e não faz diferença. Com isto nós chegamos à segunda sabedoria: a segunda sabedoria é perceber a igualdade. A natureza de Buda está dentro de cada um, mas isto é difícil de entender. Cada um pensa que é diferente. Claro, há diferenças, como a água, que em uma forma é gelo, e uma outra que é neblina, ou nuvens ou chuva, mas afinal, tudo é a mesma água.

Descobrir que nós somos água, esta é a sabedoria da igualdade. Não há diferenças e porque não há diferenças é tudo igual. Isto não quer dizer por exemplo que o presidente de um país seja a mesma coisa que um trabalhador comum, de baixa categoria. O trabalhador comum pode estar preocupado com o futuro do país, mas talvez ele não possa fazer nada pelo país, cada um tem a sua função e papel, cada um faz o que pode no seu trabalho.

Dentro de um mosteiro Zen há várias tarefas diferentes. Há o cozinheiro, os diretores do mosteiro, o disciplinário, etc., mas isto não significa que o valor de cada pessoa seja diferente. Por isto os Budistas quando se encontram fazem o Gasshô. Gasshô significa reverenciar a natureza de Buda que está dentro de você. Estamos vivendo e sofrendo, com dores, mas no fundo nós temos a mesma qualidade.

O treinamento de Zen é descobrir o verdadeiro eu, e depois aplicar isto dentro da vida cotidiana, esta capacidade e potencialidade são muito grandes. Para se encontrar esta experiência e esta sabedoria, tem que se viver neste mundo a vida cotidiana. Temos diferenças, mas no fundo é tudo igual. Por exemplo, se se colocar o orvalho transparente em cima de uma folha verde, nós vemos um orvalho verde. E o mesmo orvalho transparente, se você colocar em cima de uma flor vermelha, você vê a cor vermelha. Assim, nós estamos vendo cores e formas diferentes em cima de cada pessoa, mas neste momento o que ninguém vê é aquela cor transparente.

A igualdade do vazio está dentro de nós, por isto a primeira experiência Zen, através da meditação, é encontrar o corpo do Buda cósmico. Este trabalho é difícil, porque é necessário limpar tudo aquilo que já se aprendeu desde que nasceu, e também aqueles Karmas que estamos carregando. Por isso, o importante é começar a escutar o ensinamento e experimentar o ensinamento.

O Buda disse, vocês não devem me respeitar apenas com as aparências, vocês devem experimentar as minhas palavras como se experimenta e testa o ouro dentro do fogo. Dessa forma, quando a pessoa tem esta experiência, a sua fé e a sua confiança se tornam absolutas, e não mudam mais, não importa o que aconteça. Eu falei de dois tipos de sabedoria: a primeira aquela sabedoria do espelho, e depois a sabedoria da igualdade. A terceira sabedoria é a pessoa começar a trabalhar dentro deste mundo mundano, como uma flor de lótus que desabrocha no meio das chamas. Como pode uma flor abrir dentro das chamas? Isto pode acontecer. Moisés atravessou o Mar Vermelho. Um homem chamado Jesus Cristo, o Nazareno, mudou o  mundo inteiro.  Através do treinamento, o que nós procuramos não são forças sobrenaturais, nós damos muita importância é à nossa consciência. Através da meditação nós não vamos voar pelo espaço, mas o nosso intelecto consegue chegar até à lua. Realmente, isto é uma coisa milagrosa. Este tipo de trabalho, quando a pessoa conhece a si mesmo, o seu eu verdadeiro, ela começa a mudar todos os pontos de vista, cento e oitenta graus.

Este mundo tem muitas compreensões erradas. Pensamos que existe um eu, mas um eu não existe, apenas os materiais e elementos estão se unindo provisoriamente, formando este corpo.

Nós temos a consciência e a inconsciência depositando todas as lembranças das vidas passadas e com isto se forma a identidade do eu, mas o eu verdadeiro não é tão pequeno. É necessário aprender aquilo que é não nascido, porque quando nasce, morre. Quando não nasce, então não morre. Quando estamos passando pela praia, nós vemos ondas chegando e desaparecendo, isto é o nascimento e a morte da vida. Quando se vê a água do mar, vê-se o aparecimento e o desaparecimento, mas a água do mar nunca vai diminuir e nunca vai aumentar; por isto, com experiência, nós mergulhamos neste samadhi de oceano. Neste caso, não há mais um nascimento e nem morte, é algo eterno, mas mesmo assim, há nascimento e há morte: isto é um pouco complicado, isto é sabedoria. Por exemplo: o meu nome é Tokuda, mas eu não sou Tokuda. Entenda isto, é muito simples. Tokuda é apenas um nome, como se fosse um rótulo. Pode colocar um outro nome para facilitar, pode chamar japonês careca, assim todo mundo entende. A sabedoria do Zen é esta: eu sou Tokuda mas eu não sou Tokuda. Eu sou Tokuda, mas eu não sou Tokuda, e é por isto que eu me chamo Tokuda.

Parece complicado, mas é necessário dobrar duas ou três vezes as idéias, aí nós chegamos realmente até nossa identidade e quando nós sabemos isto, nós vivemos a vida absolutamente. Nesse caso, nossa presença é a manifestação de todas as nossas vidas passadas.

A pessoa inteligente ou ignorante tem todas as razões para ser ignorante ou inteligente, ou bonita, ou feia, mas isto não quer dizer que ela seja melhor ou superior e que o outro seja inferior. Cada um de nós está vivendo totalmente dentro do mundo de Buda. Quando se entender isto, vem o quarto tipo de sabedoria, que é a pessoa não viver mais neste mundo de uma forma atrapalhada, porque nós mesmos somos dignos de respeito, temos que respeitar a nós próprios, não podemos mais viver fazendo tanta confusão..

Mas pensando bem, dentro de mim mesmo, será que eu mereço este respeito? Nós temos muitas e muitas sujeiras realmente, mas quando estamos sentados em meditação de pernas cruzadas, mãos cruzadas e com a boca fechada, nós somos Buda. Por que? Porque com esta posição não se pode fazer atos maus, com as pernas cruzadas, com aquela postura e com aquela respiração correta não se pode mais falar mal dos outros. Com isto, naturalmente vêm os pensamentos chamados corretos, então você mesmo é Buda. É difícil aceitar isto, mas quando você senta, que seja somente vinte minutos, trinta minutos, você é vinte minutos, trinta minutos de Buda.

Este é o ensinamento de Buda. Reconhecer a si mesmo como Buda é difícil, mas isto não tem muita importância. Vamos supor que eu queira ver o meu rosto dormindo, o olho em frente ao espelho. Quando abro o olho, já não estou mais dormindo. O treinamento para se chegar até o estado de Buda é muito difícil, mas a primeira coisa que a pessoa tem que fazer é começar a imitar. Se você começa a imitar um ladrão, então você é um ladrão. O ladrão é aquele que rouba. Então você imita o ladrão, rouba e é preso pelo guarda, não senhor guarda, estou apenas imitando um ladrão, ele vai te colocar na cadeia assim mesmo. Nós temos a idéia de ego, mas é bom imitar, fazer coisas boas, seguir o exemplo da prática dos sábios.

Diz a Bíblia que a mão esquerda não pode saber o que a mão direita fez. Realmente esta idéia de ego é muito forte, mas a única maneira através da qual nós podemos avançar é imitando as coisas boas, que são melhores do que as coisas ruins. Quando se faz coisas boas, recebe-se os efeitos bons, pela lei de causas e efeitos. Estas experiências estão sendo registradas de momento a momento, dentro de nosso inconsciente, é como uma semente que está se depositando e quando encontra as condições favoráveis brota, aí a gente começa a ver este mundo de uma forma totalmente diferente.

Existem muitas pessoas que pensam que nós nascemos neste mundo, mas não é isto. Nós nascemos no nosso próprio mundo e estamos vendo a nossa própria consciência. Por isto quando conseguimos a limpeza total dentro da nossa inconsciência, começamos a ver então um mundo maravilhoso. A pessoa está vivendo neste mundo como se fosse uma guerra, como um inferno, porque isto é um estado de consciência. Um samurai (samurai é um antigo guerreiro japonês) chegou a um mestre e perguntou: mestre, é verdade que realmente existe um inferno e também um paraíso neste mundo? O mestre disse: idiota, você não sabe destas coisas até hoje? E ainda tem a audácia de vir aqui me perguntar?

Antigamente, os guerreiros samurais tinham aquele orgulho muito forte. Nem meu próprio pai me chama de idiota. Mesmo o senhor, mestre, caso não se retratar do que disse,  não poderei deixar o senhor viver, e vou te matar com minha espada, disse o samurai. O mestre disse: muito interessante, você quer tirar a espada da bainha? Aí está o inferno. O samurai compreendeu as palavras do mestre e começou a abrir um grande sorriso. Ah, muito bem disse o mestre, agora seu sorriso é o paraíso. Dessa forma, estamos vivendo cada momento no estado de inferno, apegados como se fôssemos demônios famintos, temos aquela falta de inteligência como se fôssemos um animal, e fazemos complicações como se fôssemos Asuras.

Para nós seres humanos, a água é água, claro. Mas para os peixes, a água não é água. Água para os peixes é casa, ou é um palácio. Para os seres divinos a água é como se fosse um espelho, ou uma jóia. Para os demônios e para os espíritos famintos, água não é mais água, mas sim fezes, pus e sangue. Assim, a forma como se vive neste mundo depende do estado de consciência de cada um e por isto o treinamento de Zen é transformar este corpo físico de carne e osso no corpo de Buda.

Este corpo quer dizer inclusive a nossa consciência. Quando o mundo interno se transforma, então o mundo externo também começa a se transformar. Da maneira que eu mudo o presente, começo a mudar o futuro e posso até mudar o passado. Há mais ou menos vinte anos atrás eu estava treinando no mosteiro no Japão, e lá eu apanhava muito, este é um método de Zen, mas hoje em dia eu agradeço aquele tipo de treinamento que passei. Naquela época eu sofria e pensava porque estou aqui? Tudo isto que estou fazendo é bobagem. Pensava desta maneira, mas hoje sou agradecido realmente, foi tudo muito bom para mim. Eu perdi o meu pai com a última guerra, a segunda guerra mundial. Meu pai dizia para nós, que somos três irmãos, que um talvez fosse médico, um monge e o outro músico. Ele era marinheiro e foi à segunda guerra mundial, sabia que iria morrer e realmente morreu, mas estava tranqüilo e hoje em dia eu agradeço o fato dele ter morrido com a guerra, porque com isto recebi esta mensagem, e pude realizar pelo menos um de seus desejos.

O médico, o monge, o músico, então pelo menos uma destas coisas eu cumpri. Com a morte dele, estou aqui e estou muito contente com aquilo que estou fazendo. Eu sempre quis este tipo de trabalho no Brasil e agora também na Argentina. Eu me encontro comigo mesmo, estando aqui.

O treinamento Zen sempre coloca viver o aqui e o agora. Se a pessoa consegue viver aqui e agora fazendo bons trabalhos, não é futuramente que as coisas vão ficar boas. É neste momento mesmo, imediatamente, que o mundo inteiro fica bom.

Acho que estou falando já há muito tempo. Faltam doze minutos para as dez horas, eu vou parar um pouquinho e se tiverem perguntas sobre alguns assuntos, sobre Budismo ou Zen,  ou sobre  outra coisa qualquer, eu gostaria de conhecer as perguntas.

Pergunta: Como o senhor aplicaria a doutrina Zen para o ocidental?

Resposta: Ah, sim. A aplicação do Zen para o mundo ocidental não mudou nada desde que o Zen surgiu. Onde o Budismo correto é transmitido sempre existe a prática do Zazen, só isto.

Pergunta: Qual é o mecanismo através do qual este processo físico produziria uma evolução no homem? Como poderiam os castigos que o senhor recebeu no seu treinamento ajudar na sua evolução?

Resposta: Eu acho que qualquer profissão, para que se consiga alcançar um alto nível, tem muitas dificuldades: artistas ou dançarinos ou esportistas têm que realizar esforços ou sacrifícios. Durante este processo de treinamento Zen estamos tentando conseguir aquele mergulho profundo e justo neste momento chega o instante do limite físico e espiritual. O mestre sabendo disto, aplica a pancada justamente para que se consiga superar aquela dificuldade.

Pergunta: Será que nós neste momento temos a menor possibilidade de chegarmos à compreensão do Zen?

Resposta: Neste momento é muito importante a confiança na palavra do Buda: nós somos originalmente Buda. É isto. Porque Buda, o Buda Gautama pessoalmente realizou isto e deixou o ensinamento, e com isto muita gente mudou. Estes são os grandes testemunhos. Pelo menos com o nome Budismo historicamente nunca houve motivações para guerras ou escravidão.

Pergunta: Porque foi que o senhor disse que com o intelecto a pessoa pode chegar até a Lua?

Resposta: Intelecto é a sexta consciência, ainda tem limites. Com a consciência nós podemos juntar os conhecimentos cada vez mais, até construir naves espaciais para ir até a Lua, esta força é muito grande, mas a sexta consciência é limitada à inconsciência que estamos depositando. O que se pode modificar são as sétima e oitava consciências, o inconsciente.

Pergunta: Se você estuda o suficiente você pode ir até a Lua?

Resposta: Chegar até a Lua não interessa, o importante é que precisamos mudar não só o que estamos vendo, escutando, como também mudar internamente. O assunto não é este.

Pergunta: Através do intelecto como prática a pessoa pode despertar para estes níveis de consciência?

Resposta: Como eu já disse, o aprendizado tem que ser com o intelecto. Escutar, pensar e experimentar, mas o aprendizado é estudar não estudando, é desejar para não mais desejar. Por exemplo, se temos algum problema de estômago, sentimos a presença do estômago, e por isto procuramos o médico, e começamos a tomar remédio, mas quando a pessoa está curada totalmente, então ela não se lembra mais da presença do estômago. O nosso intelecto tem limites, mas mesmo assim os Budistas dão muita importância a ele. Por isto eu coloquei a importância do nosso intelecto, conseguir chegar até à Lua.

Pergunta: O Buda cósmico é o mesmo que o Cristo cósmico?

Resposta: Acredito que sim.

Pergunta: Porque os monges mostram apenas um ombro coberto com o manto?

Resposta: Isto é um costume da Índia. Quando o monge mostra o ombro direito, isto quer dizer respeito para todos. Quando os dois ombros estão cobertos com o manto, isto significa que ele é Buda.

Pergunta: No Zen, o coração espiritual está do lado direito?

Resposta: O Budismo não coloca a direita ou a esquerda, é o Caminho do Meio.

Pergunta: O que significa este rosário que o senhor tem sobre a mesa?

Resposta: Este rosário tem 108 contas e nós temos 108 ignorâncias. Este rosário é para lembrar disto. Temos o costume nos templos Budistas de, no fim do ano, na passagem do ano, tocarmos 108 gongos. Cada toque é para esquecer uma ignorância, para receber o ano novo.

Pergunta: O desejo interior é o equivalente da vontade divina? Não devemos passar pelo desejo para chegarmos à vontade divina?

Resposta: Nós Budistas não procuramos eliminar os desejos, mas sim saber que nós temos desejos e refletindo sobre isto, já se elimina a metade dos desejos.

Pergunta: Há diferença entre o Budismo ortodoxo e o Zen?

Resposta: Acho que sim.

Pergunta: Por quê?

Resposta: O Budismo Zen surgiu na China, naquela época alguns imperadores eram Taoístas e começaram a atacar os Budistas. Queimaram os templos, livros sagrados, mataram monges e monjas. Por essa razão, alguns monges se tornaram leigos, outros fugiram para o fundo da montanha onde não chegava ninguém. Eles começaram a transmitir os ensinamentos Budistas sem livros, sem imagens de Buda, sem nada. Apenas transmitiam com este contato direto entre o mestre e o discípulo. Quando por exemplo, eu te pergunto de onde você vem, eu não estou falando sobre se você veio do Brasil ou do Japão. Antes de você nascer onde você estava? Depois da morte, onde você vai? Perguntando assim, entre conversas, perguntas e respostas, foi que surgiu o ensinamento Zen. Um mestre estava fazendo limpeza na sala, chegou um monge e disse, "Este mundo originalmente está todo limpo. Porque precisa varrer?" "Aí vem um outro grão de pó", disse o mestre. Assim, vivendo a vida cotidiana e através destes tipos de diálogos, o Zen mostra o ensinamento e isto geralmente não se encontra em outras escolas Budistas ortodoxas, onde tudo depende de sutras, sermões de Buda, cerimônias. O praticante de Zen não dá muita importância a livros sagrados Budistas ou exterioridades. A prática do Zen é a meditação, é entrar no mesmo estado de Iluminaç que o Buda alcançou. Quando se chega a este ponto pode-se usar livros sagrados ou sutras ou ensinamentos livremente.

Pergunta: Para meditar é necessário preparação?

Resposta: Sim, é necessário. Em primeiro lugar é necessário o desligamento com o mundo exterior, depois comer e beber com moderação, procurar agir corretamente, e por aí vai.

Pergunta: Como fazer para deixar tudo de lado?

Resposta: Você deve ver o corpo e a mente como uma coisa só, por isto há o método de Zazen. Sentar naquela postura, controlar a respiração, é muito importante. O Zazen é o barômetro da nossa saúde. Quando a pessoa senta e sente dores sempre no mesmo lugar, estão este lugar, fígado, rins, pulmão etc., está com problema. Depois vem o controle da respiração. A respiração está ligada à emoção diretamente. Quando a pessoa está triste chora, quando está com muita raiva, fica com a respiração ofegante. Se se sabe controlar a respiração internamente, naturalmente consegue-se o estado da mente em paz.

Por exemplo, existe o método de Mu como mantra. Quando se expira, é utilizado este método. Geralmente a pessoa respira 17 ou 18 vezes por minuto.

Mesmo que você não tenha experiência, se usar este método de Zazen, imediatamente a quantidade de respirações baixa à metade ou menos ainda, sem esforço algum. Eu vou mostrar. Alguém de vocês pode contar Muuuuuuuuuu (expira). Isto é uma expiração. Geralmente leva-se 10 segundos para expirar e 5 para inspirar. Quando se medita desta forma, respira-se cerca de 4 vezes por minuto, com isto aparece a onda alfa no cérebro. Isto é o estado tranqüilo, descansado, dessa forma pode-se ver o mundo tranqüilo e em paz.

Pergunta: Como é que se trabalha um Koan?

Resposta: O trabalho Koan é se tornar uma coisa só com o Koan. Um monge perguntou, o cachorro tem a natureza de Buda ou não? O mestre respondeu Mu. Este é um Koan. O trabalho com Mu é se tornar Mu, o universo inteiro se tornar Mu. Este corpo pequeno desaparece e o eu se torna o universo inteiro, o mundo inteiro é só Mu. Este é o trabalho do Koan. Não sou eu que faço a concentração do Mu, senão eu e Mu seríamos duas coisas separa-das. Mu é que está fazendo Mu. (A tradutora explica). Isto já é explicação. Merece trinta pancadas.

Pergunta: O Budismo Zen acredita na encarnação?

Resposta: Sim e ao mesmo tempo não.

Pergunta: Se sim, isto não seria uma prolongação do ego?

Resposta: Por isto o outro lado é não. Agora quero perguntar: Porque você pergunta isto?

Pergunta: Para se chegar à perfeição temos que fazer ascetismo?

Resposta: O treinamento Zen não é ascético. Por exemplo, quando a moça está cantando, se a corda do violão está muito tensa ela quebra e se está muito relaxada não faz som. Isto é o Caminho do Meio. O Buda Shakyamuni fez vários tipos de treinamento ascético na sua época. Quando compreendeu que aquilo só iria levá-lo à exaustão e à morte, ele abandonou o treinamento ascético. Para chegar à compreensão completa, simplesmente relaxe todo o corpo e transforme o inconsciente totalmen-te, desde a consciência de Alaya até a consciência de Manas.

As  pessoas  pensaram  por três vezes  que o Buda  tinha  morrido com o treinamento ascético, mas ele não morreu. Um tipo de treinamento é parar a respiração até morrer, o ar sai pelo ouvido. As pessoas acreditavam que se se conseguisse morrer desta forma, depois da morte elas nasceriam no paraíso, mas a primeira pergunta do Buda, que deu origem à sua procura, era por quê existe o sofrimento? O que é a extinção do sofrimento? Isto foi uma coisa que o treinamento ascético não respondeu, por isto ele escolheu a meditação e começou a meditar por conta própria. Dessa forma, o treinamento Budista não é ascético, é o Caminho do Meio e é normal, a gente fica completamente normal, não é para ganhar poderes sobrenaturais. Como Mestre Dogen disse, o nariz está vertical, o olho está horizontal.




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