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A CONDIÇÃO NATURAL Ou como as coisas são e como a confusão as faz aparecer de Padmasambhava Texto extraído do livro "La Simplicité de la Grande Perfection" Traduzido do tibetano e apresentado por James Low Traduzido para o português por: Karma Tenpa Dhargye INTRODUÇÃO Este texto é uma seção do [gSang-sNgags Lam-Rim] de Padmasambhava, que existe ao mesmo tempo na linhagem aberta [bKa’-Ma] e na linhagem dos tesouros [gTer-Ma]. A linguagem é muito técnica e hermética, e ele condensa uma grande quantidade de informações em segundo plano. Poderíamos dizer que se trata de uma série de aforismos que constroem um raciocínio e um ponto de vista. Essas afirmações não são evidentes em si-mesmas de um ponto de vista comum, e elas não são tampouco explicadas ou justificadas. Mas não é um tratado filosófico racional, lógico; é uma experiência real de Padmasambhava, o grande yogui dzogchen de Oddiyana. Esse texto aparece no "Byang-gTer Chos-sPyod" e ele é recitado cada dia para os monges, os yoguis e os laicos que seguem esta linhagem. A compreensão da Base comum do samsara e do nirvana é essencial para a visão dzogchen e, nesse curto texto, a formação do samsara é claramente exposta: a ignorância é adventícia, ela não é inata, é uma nuvem passageira que vela a verdadeira natureza da mente semelhante ao céu, mas não a altera. Reconhecendo as qualidades da condição natural, se torna mais fácil identificar as diferentes manifestações do estado de extravio ou experiência do samsara. É interessante comparar isso com as experiências tradicionais, mais lineares, dos doze nidanas (doze elos). O texto ilustra o valor da visão, não enquanto filosofia iluminadora ou outra visão mística mais elevada, mas como um meio muito prático, muito eficaz, de reconhecer um desvio na meditação. O texto expõe a visão que deveria ser reconhecida. Isso corresponde ao primeiro dos três celebres aforismos de Garab Dordje, e a descrição do desenvolvimento da ignorância – ou falta de consciência – fornece o pano de fundo essencial ao segundo e terceiro célebres "pontos". [...] As reações habituais aos fenômenos e às experiências que temos provêm da ignorância ou ausência de presença. Esta compreensão enquadra a existência comum, a deslocando da falsa verdade relativa para a pura verdade relativa. Compreender a fonte de nossa experiência comum nos permite ir mais fundo, e perceber esta fonte relativa que é a ignorância, até que penetremos na fonte absoluta que é o reino natural da consciência. É o nível mais elevado de redimensionamento, um estado aberto, sem moldura que põe em evidência o fato de que todos os quadros de referência são montagens. Nada deve ser trocado ou alterado de nenhuma maneira. É talvez nossa experiência ‘do que é’ que se aperfeiçoa quando nos liberamos das fabricações artificiais e quando permitimos à luminosidade natural e à claridade da existência de revelarem-se por si mesmas. A CONDIÇÃO NATURAL E O ESTADO DE EXTRAVIO O TEXTO A CONDIÇÃO NATURAL No que concerne a condição natural, "ela é não dual, surgindo espontaneamente, pura desde o início, é a budeidade primordial". (Padmasambhava comenta agora sua própria afirmação) Há quatro aspectos disso: - Primeiro, a condição natural permanece na não-dualidade.
Há cinco aspectos disso:
Brevemente, após a realidade exposta, o sujeito, todos os fenômenos do samsara e do nirvana, tudo o que pode aparecer surge sem cessar, assim a não-dualidade está livre de limitações. A não-dualidade é introduzida desse modo afim de que eliminando as idéias falsas, sejamos liberados do apego à crença nos fenômenos dualistas separados. O objetivo é a realização da não-dualidade. Todos os fenômenos podem ser englobados no duplo aspecto da essência (não-dualidade das aparências e vacuidade) e eles são não-duais, permanecendo somente em um único ponto [Thig-le Nyag-gChig]. - Segundo, a condição natural permanece enquanto que aparência despida de esforço. Há cinco aspectos disso:
Brevemente, na realidade aberta, o sujeito – todos os fenômenos que podem aparecer no samsara e no nirvana – não residem em nenhuma natureza própria real, assim eles surgem sem esforço e sem nenhuma limitação. A aparência sem esforço é introduzida desse modo afim de que eliminando a falsa idéia, sejamos liberados do desejo de que um outro alguém possa nos ajudar (à atingir a iluminação). O objetivo é ser livre da necessidade de buscar e de praticar. A essência desta realização é que todos os fenômenos, que são todas as aparências possíveis do samsara e do nirvana, surgem sem esforço na mente.
Brevemente, a realidade aberta – o sujeito, todos os fenômenos possíveis do samsara e do nirvana – não comporta nada que deva ser rejeitado, também é naturalmente pura. Portanto, é a pureza ilimitada. A pureza perfeita é introduzida desse modo afim de que eliminando a idéia falsa, sejamos liberados do apego ao fato de crer que a confusão é um estado natural da mente. O objetivo é a realização da pureza perfeita. A essência-realidade é naturalmente e completamente pura.
Nossa própria consciência é a mente desperta que está purificada [sangs] da confusão dos fenômenos dualistas e que tem o desenvolvimento [rGyas] da cognição primordial não-dual. Portanto, isso é a budeidade [Sangs-rGyas]. Ainda mais, ela não tem um átomo de confusão, pois é pura [Sangs], porque não é que ela tenha sido alguma vez sem não-dualidade e que a não-dualidade tenha sido desenvolvida [rGyas] mais tarde. Sua característica natural é estar livre da confusão, como a essência se desenvolve enquanto cognição primordial não-dual. É a budeidade primordial. A natureza aberta é o modo natural. A expressão espontânea da claridade é o modo radiante. A não-dualidade desta claridade e desta vacuidade é o modo de manifestação. O que é a natureza vazia, e como aparece a claridade da expressão natural? Claridade e vacuidade são não-duais ou indissociáveis enquanto cognição primordial desta compreensão. Estar sem confusão diante desta verdadeira natureza, é a renúncia perfeita. Ter a não-dualidade desta essência, é a realização perfeita. Se não houvesse uma tal budeidade primordial, a meditação não poderia faze-la aparecer. É como a pedra Saledram que não teve nunca ouro (embora se pareça muito com ouro). Mesmo se trabalharmos sobre ela, jamais se tornará ouro. A budeidade primordial é apresentada desta maneira a fim de que eliminando as falsas idéias sejamos liberados do apego a crença de que a Base inclui a confusão. O objetivo é realizar a budeidade primordial, realizar a essência de nossa própria consciência enquanto modos e conhecimentos primordiais. O ESTADO DO EXTRAVIO (DA ALUCINAÇÃO). Visão impura No que se refere ao estado de extravio [‘Khrul-Lugs], "ele é em essência , ignorância, ação cármica e emoção perturbadora, visão falsa e sofrimento". (Padmasambhava comente agora sua própria afirmativa)
- Primeiro, no que concerne à Base da confusão, a mente em-si, a essência do despertar, existe sem nenhuma limitação como ser ou não-ser. Enquanto não reconhecemos isso como nossa própria natureza, acreditamos em ser ou não-ser, nos apegamos a diversas idéias e, assim, existe a confusão. - Segundo, há a causa [rGyu] que é a ignorância. - Há cinco aspectos disso:
Assim, a partir deste instante de visão falsa, outras coisas surgem, igualmente ilusórias. Sobre a Base da percepção de entidades reais, há apego às coisas como se elas fossem permanentes e nos apropriamos dessas noções fixas. É ao olhar assim com confusão que os fenômenos do samsara são criados. O estado de extravio é explicado desta maneira por duas razões. Primeiramente, as idéias falsas devem ser eliminadas a fim que sejamos liberados da crença, estabelecida na mente, segundo a qual o extravio esta presente na Base. Em segundo, temos necessidade do objetivo que é de podermos realizar a mais pura natureza, porque a Base é livre de confusão. De resto, como o falso surgimento do extravio apareceu subitamente, se reconhecermos sua natureza, ela então é liberada em seu próprio lugar. Como quando reconhecemos que uma insígnia é uma insígnia, a confusão de a tomar por um homem é liberada na pureza original. |