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SUTRA DE HUI-NENG - SUTRA DA PLATAFORMA
Capítulo VIII. Escola Súbita e Escola Gradual(1)

O Sutra do VI Patriarca Hui-Neng
NO ALTO ASSENTO "DO TESOURO DO DHARMA"
Traduzido ao Inglês por A.F.Price e Wong Mou-Lam
Traduzido ao Português por Cláudio Miklos


Enquanto o Patriarca estava morando no Monastério Pao Lin, o Grande Mestre Shen Hsiu ensinava no Monastério Yu Chuan de Ching Nan. Naquela época floresceram lado a lado as duas Escolas, a de Hui Neng [Wei Lang] ao Sul e a de Shen Hsiu ao Norte. Como as duas Escolas eram distinguidas uma da outra pelos nomes "Súbita" (ao Sul) e "Gradual" (ao Norte), a questão sobre qual das duas seitas deveria ser seguida confundia certos estudiosos budistas (daquele tempo).

(Vendo isto), o Patriarca dirigiu-se à assembléia desta forma:

"No que diz respeito à essência do Dharma, existe [apenas] uma Escola. (Se alguma distinção existe) ocorre do fato de que o fundador de uma escola é um homem do Norte, enquanto o outro é um Sulista. Uma vez que existe apenas um Dharma, alguns discípulos percebem-no mais depressa que outros. [Portanto] porque nomear ‘Súbito’ ou ‘Gradual’?. O Dharma [na verdade] não é ‘Súbito’ nem ‘Gradual’. [Mas] Algumas pessoas são mais perspicazes enquanto outras mas lentas, eis porque denomina-se [as diferentes experiências de sabedoria] ‘Súbito’ e ‘Gradual". (Apesar do que o Patriarca havia dito,) os seguidores de Shen Hsiu criticavam o Patriarca. Eles o desacreditavam dizendo que, sendo ele um analfabeto, não poderia ser merecedor de qualquer respeito. Por outro lado, o próprio Shen Hsiu admitia que era inferior ao Patriarca, que o Patriarca atingiu a sabedoria sem a ajuda de um professor, e que ele compreendeu completamente o ensino da Escola Mahayana. "Além disso," ele acrescentava, "meu professor, o Quinto Patriarca, não haveria transmitido a ele o manto e a tigela sem bons motivos. Eu lamento que, devido ao patronato do estado - o qual não mereço de forma alguma -, eu esteja impossibilitado de viajar tão longe para dele receber instruções pessoalmente. (Mas) vós todos deveriam ir para Ts’ao Ch’i buscar consultá-lo.

Certa vez disse ao seu discípulo, Chi Ch’eng, "Tu és inteligente e brilhante. Em meu benefício, tu precisas ir a Ts’ao Ch’i para assistir as conferências de lá. Faças o melhor para se lembrar do que aprendes, de forma que ao seu retorno possas repetir para mim". Agindo sob instrução de seu professor, Chi Ch’eng foi para Ts’ao Ch’i. Sem contar de onde veio, ele uniu-se à multidão para ouvir o Patriarca. "Alguém se escondeu aqui para plagiar minha conferência", disse o Patriarca à assembléia. Pouco tempo depois, Chi Ch’eng mostrou-se, fez reverência, e contou ao Patriarca qual era sua missão. "Tu vens de Yu Ch’uan Monastério, então?" comentou o Patriarca. "Tu deves ser um espião".

"Não, eu não sou", Chi Ch’eng respondeu.

"Por que não [seria]?", perguntou o Patriarca. "Se eu não vos tivesse contado [sobre mim]", Chi Ch’eng disse, "seria um espião. Considerando que eu vos disse toda a verdade, eu não o sou". "Como seu professor instrui seus discípulos?", perguntou o Patriarca. "Ele nos diz para meditar na pureza, manter a posição sentada [zazen] todo o tempo e não dormir", Chi Ch’eng respondeu. "Meditar na pureza", disse o Patriarca, "é uma debilidade e não Dhyana. Reprimir a si mesmo na posição sentada todo o tempo é improdutivo. Escute meus versos:

Um homem vivo [não deve] sentar-se e não descansar (todo o tempo), Enquanto um homem morto [é capaz de] deitar-se e não se sentar [para sempre].

Neste nosso corpo físico por que deveríamos nos impor a tarefa de se sentar? [de forma repressora]" Fazendo reverência uma segunda vez, Chi Ch’eng comentou, "Embora eu tenha estudado o Budismo durante nove anos sob a orientação do Grande Mestre Shen Hsiu, minha mente não havia contudo sido despertada para o esclarecimento. Mas assim que vós falastes, minha mente foi iluminada. Como a questão sobre renascimentos incessantes é momentosa, por favor tenhais piedade de mim e dai-me mais orientações". "Eu entendo", disse o Patriarca, "que teu professor dá aos seus discípulos instruções sobre Sila (regras disciplinares), Dhyana (meditação), e Prajna (Sabedoria). Por favor, me fales como ele define estas condições". "De acordo com seu ensino", Chi Ch’eng respondeu, "se abster de todas as más ações é Sila, praticar tudo que é o bem é Prajna, e purificar a própria mente é Dhyana. Este é o modo como ele nos ensina. Eu posso saber sobre vosso sistema?"

"Se dissesse a ti", disse o Patriarca, "que eu tenho um sistema de Dharma para transmitir aos outros, estaria enganando-te. O que eu faço aos meus discípulos é libera-los da sua própria escravidão usando os métodos conforme necessário ao caso. Usando um nome que não passa de um subterfúgio, este (estado de liberação) pode ser chamado de Samadhi. O modo como teu mestre ensina Sila, Dhyana, e Prajna é maravilhoso; mas minha posição é diferente".

"Como pode ser diferente, Senhor", Chi Ch’eng perguntou, "quando só há uma forma de Sila, Dhyana e Prajna?"

"O ensino de teu mestre", respondeu o Patriarca, "é para os seguidores da Grande Escola [do Mahayana], enquanto o meu é para esses da Escola Suprema [do Mahayana]. O fato de que alguns percebem o Dharma mais depressa e profundamente do que outros, conta para a diferença na interpretação. Tu podes escutar e ver se minha instrução é igual a tua. Expondo o Dharma, eu não me desvio da autoridade da Essência da Mente (i.e., eu falo o que percebo intuitivamente). Falar de outra forma indicaria que a Essência da Mente do expositor está obscurecida e que ele só pode tocar o lado fenomenal do Dharma. O verdadeiro ensino de Sila, Dhyana e Prajna deveria estar baseado no princípio de que a função de todas as coisas deriva da Essência da Mente. Escute meus versos:

Livrar a mente de toda a impureza é o Sila da Essência da Mente.
Livrar a mente de toda a perturbação é o Dhyana da Essência da Mente.
Aquilo que nem aumenta nem diminui é o Diamante (usado como símbolo para a Essência da Mente);
‘Vir’ e ‘ir’ são fases diferentes de Samadhi".

Tendo ouvido isto, Chi Ch’eng desculpou-se (por haver feito uma pergunta tola) e agradeceu ao Patriarca sua instrução. Ele ofereceu-lhe os seguintes versos então:

O ‘Ego’ nada mais é do que um fantasma criado pela união dos cinco skandhas, E um fantasma não pode ter nada a ver com a realidade absoluta. Sustentar que há um Tathata (Assim Ser) como nossa meta ou ao qual devemos retornar É outro exemplo de ‘Dharma Impuro’ (pois o Puro Dharma está além de conceitos e palavras).

Aprovando o que ele disse em seus versos, o Patriarca retrucou, "O ensino de teu mestre em Sila, Dhyana e Prajna aplica-se aos homens com uma pequena base de sabedoria [menos perspicazes], enquanto o meu aplica-se àqueles cuja base de sabedoria é mais ampla. Aquele que percebe a Essência da Mente pode dispensar tais doutrinas como Bodhi, Nirvana, e ‘Conhecimento de Emancipação’. Somente aqueles que não possuem um único sistema de Dharma podem formular todos os sistemas de Dharma, e aqueles que podem entender o significado (deste paradoxo), podem se valer de tais termos. É indiferente para esses que perceberam a Essência da Mente se eles formulam todos os sistemas de Dharma ou dispensam todos eles. Eles estão em liberdade para ‘vir’ ou para ‘ir’ (i.e., eles podem permanecer ou deixar este mundo à vontade). Eles estão livres de obstáculos ou impedimentos. Eles tomam ações apropriadas de acordo com as circunstâncias. Eles dão respostas satisfatórias de acordo com o temperamento do buscador. Eles percebem contemplativamente que todos os Nirmanakayas são unos com a Essência da Mente. Eles atingem a liberação, os poderes psíquicos (Sidi) e o Samadhi, que os permitem executar a árdua tarefa de salvação universal tão facilmente como se estivessem apenas brincando. Eis como são os homens que perceberam a Essência da Mente!"

"Mas quais são os princípios pelos quais somos guiados quando lidamos com todos os sistemas de Dharma?", foi a próxima pergunta de Chi Ch’eng. "Quando nossa Essência da Mente está livre de impurezas, paixões imaturas e perturbações", respondeu o Patriarca, "quando introspectamos nossa mente de momento para momento através do Prajna, e quando não nos apegamos a coisas e objetos fenomênicos, estamos livres e liberados. Por que nós deveríamos formular qualquer sistema de Dharma, quando nossa meta pode ser alcançada não importa se viramos à direita ou à esquerda? Uma vez que com nossos próprios esforços percebemos a Essência da Mente, e desde que a realização e a prática da Lei podem ambas ser vivenciadas instantaneamente, e não gradualmente ou organizadas através de estágios, a formulação de qualquer sistema de Lei é desnecessária. Como todo os Dharmas intrinsecamente são Nirvânicos, como pode haver graduação neles?" Chi Ch’eng fez reverência e ofereceu-se como assistente do Patriarca.

Nesta posição, ele o serviu dia e noite.

Bhikkhu Chih Ch’e, cujo nome leigo era Chang Hsing-Ch’ang, era um nativo de Kiangsi. Quando jovem, era apaixonado pelas façanhas guerreiras. Desde a época em que as duas Escolas Dhyana, a de Hui Neng no Sul e de Shen Hsiu no Norte, floresciam lado a lado, fortes sentimentos sectários existiam intensamente por parte dos discípulos, apesar do espírito tolerante mostrado pelos dois mestres, os quais deconheciam as atitudes egoístas. Considerando seu próprio professor, Shen Hsiu, como tendo autoridade em igual nível daquela do Sexto Patriarca, os seguidores da Escola do Norte tinham ciúmes do dono legítimo daquele título cuja reivindicação, apoiada pelo manto herdado, era conhecida demais para ser ignorada. (Assim para se livrarem do professor rival) eles enviaram Chang Hsing-Ch’ang (que era então um leigo) assassinar o Patriarca. Com o poder psíquico de leitura mental, Patriarca foi capaz de descobrir o conluio antecipadamente. (Se preparando para a vinda do assassino), ele pôs dez moedas ao lado de seu assento. Chang chegou resoluto, e uma noite entrou no quarto do Patriarca para levar a cabo o assassinato. Com o pescoço estendido, o Patriarca esperava pelo golpe fatal. Por três vezes Chang golpeou, (mas) não foi infligido um único ferimento! O Patriarca falou-lhe então desta forma:

"Uma espada correta não se deforma,
Enquanto que aquele que é deformado não é correto.
A ti devo apenas dinheiro;
Mas minha vida não devo jamais".

A surpresa foi grande demais para Chang; ele caiu em um desmaio e não se reanimou senão após um tempo considerável. Arrependido e penitente, pediu clemência e ofereceu-se para se unir a Ordem imediatamente. Dando-lhe o dinheiro, o Patriarca disse, "Tu não deves permanecer por muito mais tempo, pois meus seguidores podem fazer-te mal. Venha me ver disfarçado em alguma outra época, e eu cuidarei de ti" Como orientado,Chang fugiu naquela mesma noite. Subseqüentemente, ele uniu-se à Ordem e, quando completamente ordenado, provou ser um monge muito diligente. Um dia, recordando o que o Patriarca disse, ele empreendeu a longa jornada para o ver e prestrar-lhe homenagem. "Por que tu demoraste tanto?", perguntou o Patriarca. "Eu tenho pensado em ti todo o tempo".

"Desde aquele dia em que vós graciosamente perdoastes meu crime", Chang disse, "eu me tornei um bhikkhu e estudei o Budismo diligentemente. Ainda acho difícil adequadamente vos retribuir a menos que eu possa mostrar-vos minha gratidão difundindo o Dharma para a libertação dos seres sensíveis. Estudando o Maha Parinirvana Sutra, que eu freqüentemente leio, não posso entender o significado de ‘eterno’ e ‘não eterno’. Vós ireis, Mestre, amavelmente me dar uma pequena explicação?" O que não é eterno é a Natureza de Buda", respondeu o Patriarca, "e o que é eterno é a mente distintiva junto com todos os Dharmas meritórios e demeritórios".

"Vossa explicação, Senhor, contradiz o Sutra", Chang disse. "[Isso] eu não ousaria, desde que herdei o ‘Selo do Coração’ do Senhor Buda", respondeu o Patriarca.

"De acordo com o Sutra", Chang disse, "Natureza de Buda é eterna, enquanto todos os Dharmas meritórios e demeritórios, inclusive Bodhi-citta (o Coração da Sabedoria) não são eternos. Como vós asseguras o contrário, esta não é uma contradição? Vossa explicação agora intensificou minhas dúvidas e perplexidades".

"Certa ocasião", respondeu o Patriarca, " a Bhikkhuni Wu Ching-Ts’ang recitou para mim o texto inteiro do Maha Parinirvana Sutra, de forma que eu pudesse explica-lo para ela. Toda palavra e todo significado que eu dei naquela ocasião concordaram com o texto. Em relação a explicação que te dou agora, ela igualmente não difere do texto". "Como minha capacidade de entender é muito ruim", Chang observou, "amavelmente vós podeis explica-lo completamente e mais claramente para mim?".

"Tu não entendes?" disse o Patriarca. "Se a Natureza de Buda é eterna, seria inútil falar de Dharmas meritórios e demeritórios; e até o fim de um kalpa ninguém despertaria o Bodhichitta. Então, quando eu digo ‘não-eterno’ é exatamente o que o Senhor Buda quis dizer com ‘eterno’. Novamente, se todos o Dharmas não são eternos, então toda coisa ou objeto teria uma natureza por si mesma (i.e., essência positiva) de sofrer morte e nascimento. Neste caso, significaria que a Essência da Mente é verdadeiramente eterna não penetra em todos os lugares. Então quando eu digo ‘eterno’ é exatamente o que o Senhor Buda quis dizer com ‘não-eterno’.

"Porque os homens comuns e [estudiosos] equivocados acreditam em um ‘Eternalismo Vicioso’ (i.e., eles acreditam na eternidade da alma e do mundo), e porque os sravakas (aspirantes à condição de arhat) confundem a eternidade do Nirvana como algo não eterno, as oito noções subvertedoras surgem(2). Para refutar estas visões unilaterais, o Senhor Buda falou no Maha Parinirvana Sutra sobre a ‘Doutrina Suprema’ do ensino budista, i.e., verdadeira eternidade, verdadeira felicidade, verdadeiro eu e verdadeira pureza.

"Ao seguir subservientemente as palavras do Sutra, tu ignoraste o espírito do texto. Assumindo que o que perece seja não-eterno e que o que se mantém imutável seja eterno, tu interpretaste mal o ensino do Senhor Buda [quando estava] próximo da morte (contidas no Maha Parinirvana Sutra) que é Perfeito, profundo, e completo. Tu podes ler mil vezes este Sutra, mas não encontrarás nenhum benefício disto".

De repente Chang despertou para o pleno esclarecimento, e ofereceu os seguintes versos ao Patriarca:

Para refutar a convicção dogmática da ‘Não-eternidade’ Senhor Buda pregou a ‘Natureza Eterna’.

Aquele que não sabe que tal ensino é só um hábil subterfúgio(3) Pode ser comparado à criança que apanha pedrinhas e as chama de pedras preciosas.

Sem esforço em minha parte a Natureza de Buda se manifesta.

Isto não é devido à instrução de meu professor Nem a qualquer realização própria.

"Tu percebeste agora plenamente (a Essência da Mente)", comentou o Patriarca, "e daqui por diante tu deverias se chamar Chih Ch’e (perceber completamente)." Chih Ch’e agradeceu o Patriarca, fez reverência, e partiu.

Um menino de treze anos chamado Shen Hui que nasceu na família Kao de Hsiang Yang, veio do Monastério Yu Chuan para prestar homenagem ao Patriarca.

"Meu virtuoso amigo", disse o Patriarca, "deve ter sido duro para ti empreender uma jornada tão longa como esta. Mas podes me dizer o que significa o ‘princípio fundamental?’ Se tu fores capaz, conhecerás o proprietário (i.e., a Essência da Mente). Tente dizer algo, por favor ". "Não-apego é o princípio fundamental (4), e conhecer o proprietário é perceber (a Essência da Mente)", Shen Hui respondeu. "Este noviço [samanera] está pronto para nada além do que falar à toa!", reprovou o Patriarca.

Logo após Shen Hui perguntou ao Patriarca, "Em sua meditação, Senhor, o senhor vê (sua Essência da Mente) ou não?" Golpeando-o três vezes com seu bastão, o Patriarca lhe perguntou se ele sentia dor ou não. "Doloroso e não doloroso", Shen Hui respondeu. "Eu vejo e não vejo", replicou o Patriarca.

"Como é que o senhor vê e não vê?" Shen Hui perguntou. O que eu vejo são minhas próprias faltas", respondeu o Patriarca. "O que eu não vejo é o bem, o mal, o mérito e o demérito dos outros. Eis porque eu vejo e não vejo. Agora me conte o que queres dizer com ‘doloroso e não doloroso’. Se tu não sentes nenhuma dor, serias tão insensível como um pedaço de madeira ou pedra. Por outro lado, se tu sentes dor, e a raiva e o ódio são despertados assim, tu estarias na mesma posição de um homem comum.

"O ‘ver’ e ‘não-ver’ ao qual te referes são um par de opostos; enquanto ‘doloroso’ e ‘não-doloroso’ pertence ao Dharma condicionado que surge e cessa (i.e., Sankrita Dharma, elementos condicionados ou causados). Sem haver percebido sua própria Essência da Mente, tu ousas enganar os outros."

Shen Hui se desculpou, fez obediência, e agradeceu ao Patriarca por sua instrução.

Dirigindo-se novamente a ele, o Patriarca disse, "Se estás sob ilusão e não podes perceber tua Essência da Mente, tu deverias buscar o conselho de algum amigo piedoso e instruído. Quando tua mente for iluminada, conhecerás a Essência da Mente, e então poderás trilhar o Caminho do modo correto. No momento tu estás sob ilusão, e não conheces tua Essência da Mente. (Em vez de buscar conselho) Tu ousas perguntar se eu conheço minha Essência da Mente ou não. Se eu o faço, eu percebo por mim mesmo. Mas o fato de eu saber não te livras de estar sob a delusão. Semelhantemente, se tu conheces tua Essência da Mente, teu saber seria inútil para mim. Em vez de perguntar aos outros, por que não o procuras em ti e o vivencias por ti mesmo?"

Fazendo reverência mais de cem vezes, Shen Hui expressou novamente seu pesar e rogou ao Patriarca que o perdoasse. (Dali em diante) ele trabalhou diligentemente como assistente do Patriarca. Endereçando-se um dia para a assembléia, o Patriarca disse, "Eu possuo algo que não tem cabeça, nem nome, nem título, nem frente e nem uma parte de trás. Há entre vós alguém que a isto conhece?" Saindo da multidão, Shen Hui respondeu, "é a fonte de todos os Budas, e a Natureza de Buda de Shen Hui".

"Eu já disse que isto não tem nome nem título, e ainda assim tu o chamas de ‘Fonte dos Budas’ e ‘Natureza de Buda’", reprovou o Patriarca. "Até mesmo se tu te confiares em um abrigo de esteira para estudos adicionais (como é hábito entre os Bhikkhus), só serás um estudioso do Dhyana com um conhecimento de segunda mão (i.e., conhecimento de livros e da autoridade verbal em vez do Conhecimento obtido intuitivamente). Depois da morte do Patriarca, Shen Hui partiu para Loyang onde ele difundiu o ensino da Escola Súbita amplamente. O trabalho popular intitulado ‘Um Tratado Explícito sobre o Ensinamento Dhyana’ foi escrito por ele. Ele é geralmente conhecido pelo nome Mestre do Dhyana Ho Tse (o nome de seu monastério).

Vendo que muitas perguntas a ele eram propostas de má fé por seguidores de várias Escolas, e que um grande número de tais questionadores haviam se reunido ao seu redor, o Patriarca falou-lhes, pleno de compaixão, como segue:

"Um seguidor do Caminho deveria anular todos os pensamentos, tanto os bons como também os maus. É apenas como um subterfúgio que a Essência da Mente é assim chamada; realmente [ela] não pode ser chamada por qualquer nome. Esta ‘natureza Não-dual’ é chamada a ‘verdadeira natureza’ na qual todos os sistemas de ensino do Dharma estão baseados. A pessoa deveria perceber a Essência da Mente assim que ela ouvir falar sobre isso". Ao ouvir isto, todos fizeram reverência e pediram para o Patriarca permissão para serem seus discípulos.

Notas:

(1) Mr. Dwight Goddard.

Quando Hui-neng [Wei lang] vivia no monastério do Patriarca em Wong-mui, o Mestre (o Monge-chefe como costumamos chama-lo) era Shen Hsiu, um notável estudioso monástico da Escola Dhyana. Após Hui-neng deixar Wong-mui, ele viveu em retiro por um número de anos, mas Shen Hsiu, desapontado por não ter recebido a indicação para Sexto Patriarca, retornou para sua casa no Norte e fundou sua própria Escola que mais tarde, sob apoio Imperial, veio a ser de grande proeminência. Mas após a morte de Shen Hsiu a Escola gradativamente perdeu prestígio, e porteriormente diminuiu de importância. Mas os diferentes princípios das duas escolas, "Esclarecimento Súbito" da Escola Súbita do Sexto Patriarca, e "Esclarecimento Gradual" da Escola do Norte de Shen Hsiu, continuou a dividir o Budismo e ainda o faz hoje em dia. O princípio em disputa é se o esclarecimento vem como uma experiência gradual, através do estudo das escrituras e da prática do Dhyana ou, como afirmam os japoneses, vem de algum tipo de súbito e convincente "Satori". Não é uma questão de rapidez ou lentidão em alcançar a meta; o "esclarecimento gradual" pode surgir antes do "esclarecimento súbito". A questão é se a iluminação surge como a culminação de um processo gradual de crescimento mental, ou se é uma súbita mudança de direção da base de consciência, do habitual apoio da faculdade de raciocínio (uma visão exterior) para um novo uso de uma faculdade intuitiva superior (uma visão interior).

(2) Manjushri perguntou a Vimalakirti, "Qual é a raiz de teu corpo?"

"Ambição e Desejo", respondeu Vimalakirti.
"Qual é a raiz da ambição e do desejo?"
"Delusão e particularização".
"Qual é a raiz da delusão e particularização?"
"As visões deturpadas".
"Qual é a raiz das visões deturpadas?"
"Não-apego"
"Qual é a raiz do não-apego?"
"Não-apego não possui raiz, Manjusri. Com o não-apego como raiz, todos os Dhamas são estabelecidos."

Vimalakirti Nirdesa Sutra.

(3) Os homens comuns e os equivocados confundem a Não-eternidade, Não-felicidade, Não-egoísmo e a Não-pureza da existência mundana com a eternidade, felicidade, egoísmo e pureza; enquanto Sravakas confundem a Eternidade, Felicidade, Egoísmo e Pureza do Nirvana com a Não-eternidade, Não-felicidade, Não-egoísmo e Não-pureza.

(4) Nota. - O objetivo de Buda é afastar a convicção dogmática de qualquer forma. Ele pregou sobre a ‘ Não-eternidade ‘ para os crentes do Eternalismo; e pregou a ‘Nem Eternidade nem Não-eternidade ‘ para aqueles que acreditavam em ambas.


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