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SUTRA DE HUI-NENG - SUTRA DA PLATAFORMA Capítulo IV. Samadhi e Prajna O Sutra do VI Patriarca Hui-Neng NO ALTO ASSENTO "DO TESOURO DO DHARMA" Traduzido ao Inglês por A.F.Price e Wong Mou-Lam Traduzido ao Português por Cláudio Miklos O Patriarca em outra ocasião pregou à assembléia como segue: Virtuosa Audiência, em meu sistema (Dhyana) Samadhi e Prajna são fundamentais. Mas não fiqueis sob a errada impressão de que estes dois são independentes um do outro, porque eles são inseparavelmente unidos e não duas entidades. Samadhi é a quintessência de Prajna, enquanto Prajna é a atividade de Samadhi. No mesmo momento que nós atingimos Prajna, Samadhi está presente; e vice-versa. Se vós entendeis este princípio, ireis entender o equilíbrio entre Samadhi e Prajna. Um discípulo não deveria pensar que existe uma distinção entre ‘Samadhi gera Prajna’ e ‘Prajna gera Samadhi’. Sustentar tal opinião implicaria em considerar que existem duas características no Dharma. Para aqueles cujas línguas estão preparadas com boas palavras mas cujos corações estão impuros, Samadhi e Prajna são inúteis, porque estes não se equilibram um ao outro. Por outro lado, quando nós somos bons tanto na mente assim como nas palavras, e quando nosso comportamento externo e nossos sentimentos internos harmonizam-se entre si, então temos o caso de equilíbrio entre Samadhi e Prajna. A disputa é desnecessária para um discípulo iluminado. Discutir se Prajna ou Samadhi vem primeiro colocaria a pessoa na mesma posição daqueles que estão sob o domínio da delusão. Discutir implica em se ter desejo de ganhar, fortalece o egoísmo, e nos amarra à convicção da idéia de ‘um ego, um ser, um ser vivente, e uma personalidade’. Virtuosa Audiência, a quê Samadhi e Prajna são análogos? Eles são análogos a uma lâmpada e sua luz. Com a lâmpada, há luz. Sem ela, haveria escuridão. A lâmpada é a quintessência da luz e a luz é a expressão da lâmpada. Em nome elas são duas coisas, mas em substância elas são um e o mesmo. É o mesmo caso com Samadhi e Prajna. Em outra ocasião o Patriarca pregou à assembléia desta forma: Virtuosa Audiência, praticar o ‘Samadhi do Modo Específico’ é fazer disto uma regra a ser praticada com retidão [sem complicações] em todas as ocasiões - não importa se nós estamos caminhando, parados, sentados ou reclinados. O Vimalakirti Nirdesa Sutra diz, "A Retidão é o lugar sagrado, a Terra Pura". Não deixeis vossas mentes serem desviadas, praticando com retidão apenas da boca para fora. Nós deveríamos praticar a retidão e não deveríamos nos prender a qualquer coisa. Pessoas sob delusão acreditam obstinadamente em Dharmalaksana (as coisas e fenômenos) e assim teimam em manter sua própria maneira de interpretar o ‘Samadhi do Modo Específico’, o qual eles definem como ‘sentando-se quietamente e continuamente, sem deixar qualquer idéia surgir na mente’. Tal interpretação nos faria iguais a objetos inanimados, e isto é como um grande obstáculo em um Caminho que deve ser mantido aberto. Livrando nossa mente de apegos a todas as ‘coisas’, o Caminho ficará livre; caso contrário, colocaremos a nós mesmos sob repressão(1). Se aquela interpretação ‘sentar-se quietamente e continuamente, etc. está correta’, por que foi que em certa ocasião Shariputra censurou Vimalakirti por se sentar quietamente na floresta?(2) Virtuosa Audiência, alguns professores de meditação ensinam que seus discípulos mantenham vigilância em suas mentes para manter a tranqüilidade, de forma a cessar qualquer atividade. Dali em diante, os discípulos abandonam todo processo mental. Pessoas ignorantes [iniciantes] podem enlouquecer por depositar muita confiança em tais instruções. Tais casos não são raros, e é um grande engano ensinar a outros tal procedimento. (Em outra ocasião) o Patriarca dirigiu-se à assembléia como segue: No Budismo ortodoxo a distinção entre Escola ‘Súbita’ e Escola ‘Gradual’ realmente não existe; a única diferença reconhecida é a de que por natureza alguns homens são perspicazes, enquanto outros são obscurecidos de entendimento. Aqueles que são esclarecidos percebem a verdade subitamente, enquanto aqueles que estão debaixo da ilusão têm que praticar gradualmente. Mas tal diferença desaparece quando conhecemos nossas próprias mentes e percebemos nossa própria natureza. Portanto estes termos, ‘gradual’ e ‘súbito’, são mais aparentes do que reais. Virtuosa Audiência, tem sido tradição em nossa escola considerar o ‘Não-pensamento’ como nosso objetivo, ‘Não-objetividade’ como nossa base, e ‘Não-apego’ como nosso princípio fundamental. ‘Não-pensamento’ significa não ser conduzido por qualquer idéia particular no exercício da faculdade mental. ‘Não-objetividade’ significa não ficar absorvido [envolvido, seduzido] pelos objetos quando em contato com os objetos. ‘Não-apego’ é a característica da nossa Essência da Mente. Todas as coisas - boas ou ruins, bonitas ou feias - deveriam ser consideradas vazias. Até mesmo em tempos de disputas e desavenças, deveríamos tratar nosso entes queridos e nossos inimigos igualmente e nunca pensarmos em vinganças. No exercício de nossa faculdade de pensamento, deixe o passado ficar morto. Se nós permitimos que nossos pensamentos do passado, presente e futuro fiquem unidos como em um encadeamento, nós nos colocaremos sob repressão. Por outro lado, se nós nunca deixarmos nossa mente presa a qualquer coisa, ganharemos a emancipação. Por esta razão, nós consideramos ‘Não-apego’ como nosso princípio fundamental. Se livrar da absorção em objetos externos é chamado ‘Não-objetividade’. Quando estamos em uma posição de assim proceder, a natureza do Dharma será pura. Por isto, nós consideramos ‘Não-objetividade’ como nossa base. Manter nossa mente livre de corrupção sob todas as circunstâncias é chamado ‘Não-pensamento’. Nossa mente deveria ficar à distância das circunstâncias, e em hipótese alguma nós deveríamos permitir que estas influenciassem a função de nossa mente. Mas é um grande engano [tentar] suprimir de nossa mente todo pensamento; pois até mesmo se nós tivéssemos sucesso abandonando todos os pensamentos, e morrêssemos imediatamente depois disso, ainda assim iremos renascer em outro lugar. Não vos esqueçais disto, ó vós que percorreis o Caminho. É ruim o bastante para um homem cometer a tolice de não saber o significado do Dharma, mas pior não seria encorajar os outros a fazer o mesmo? Estando iludido, ele nada vê e além disso menospreza o Cânone Budista. Portanto nós consideramos o ‘Não-pensamento’ como nosso objetivo. Virtuosa Audiência, irei vos explicar mais amplamente por que consideramos o ‘Não-pensamento’ como nosso objetivo. É porque existe um tipo de homem iludido que se vangloria de ter alcançado a realização da Essência da Mente; mas por estar sendo levado pelas circunstâncias idéias surgem em sua mente, seguidas por visões errôneas que são a fonte de todos os tipos de falsas noções e corrupções. Na Essência da Mente (a qual é a incorporação do Vazio), nada intrinsecamente pode ser atingido. Dizer que há realização, e falar impensadamente de méritos ou deméritos são visões errôneas e corrupções. Por isto nós consideramos ‘Não-pensamento’ como o objetivo de nossa Escola. Virtuosa Audiência, (em ‘Não-pensamento’) o que deveríamos abandonar e o que deveríamos manter em nossa mente? Deveríamos abandonar os ‘pares de opostos’ e todas as concepções insalubres. Deveríamos manter nossa mente na verdadeira natureza do Tathata (aquilo que é), pois Tathata é a quintessência das idéias, e as idéias são o resultado da atividade de Tathata. É a essência positiva de Tathata - não os órgãos de sensação - que dá surgimento às ‘idéias’. Tathata incorpora o seu próprio atributo, e então pode dar surgimento às ‘idéias’. Sem Tathata pereceriam os órgãos de sensação e os objetos de sensação imediatamente. Virtuosa Audiência, devido ao atributo de Tathata dar surgimento às ‘idéias’, nossos órgãos de sensação - apesar do funcionamento da visão, audição, toque, sabor, etc. - não precisarão estar maculados ou corrompidos em todas as circunstâncias, e nossa verdadeira natureza pode ser ‘Ego-manifestada’ todo o tempo. Portanto o Sutra diz, "Aquele que é um adepto na discriminação dos vários Dharmalaksana (coisas e fenômenos) estará firmemente assentado no ‘Primeiro Princípio’ (i.e., o eterno e prazeroso lugar do Sagrado, ou Nirvana)." Notas: (1) Um Bhikkhu certa vez perguntou ao Mestre Dhyana Shek Tau, um sucessor de um dos discípulos do Sexto Patriarca, "O que é a Emancipação?’ O Mestre perguntou-lhe de volta, "Quem te colocou nesta prisão ?" O significado desta resposta é praticamente o mesmo daquela exposta no texto aqui. Novamente, quando o Sexto Patriarca disse que o Quinto Patriarca não discutia Dhyana e Emancipação mas apenas a realização da Essência da Mente (cap. I), ele expressava a mesma idéia. (2) Vimalakirti disse a Shariputra, "No que concerne a sentar em silêncio, isto deveria significar que uma pessoa não se expõe dentro dos três mundos (i.e., a consciência desta pessoa deveria estar acima do Mundo dos Desejos, Mundo Matérial e Mundo Imaterial). Isto significa que enquanto permanece em Nirodha Samapatti (Êxtase com a cessação da consciência), a pessoa é capaz de fazer todos os movimentos corporais tais como caminhar, ficar de pé, sentar ou reclinar, etc. Isto significa que sem desviar-se da Norma, a pessoa é capaz de desempenhar vários atos mundanos. Isto significa que a pessoa pratica os Trinta e sete Bodhipaksa (Asas do Esclarecimento) sem se deixar desviar pelas visões erradas. Isto significa que [mesmo] sem extirpar [completamente] os Klesas (corrupções mentais) o praticante ainda pode alcançar o Nirvana. Aquele que for capaz de sentar-se desta forma, será aprovado pelo Buda." VIMALAKIRTI NIRDESA SUTRA |