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A vida de Garab Dorje Texto extraído do livro: "O Cristal e a via da Luz – Sutra, Tantra e Dzogchen" de Namkhaï Norbu Rinpoche Compilação e apresentação: John Shane Traduzido para o português por Karma Tenpa Dhargye Diferentemente do Budha Shakyamuni, que viveu antes dele, porém igualmente a Padmasambhava, que apareceu depois, Garab Dorje não manifestou um nascimento comum. Um indivíduo realizado pode escolher a forma, o momente e o lugar de seu nascimento, de uma maneira que parece impossível do ponto de vista limitado da visão dualista. A mãe de Garab Dorje, Sudharma, que era filha do rei de Örguien, havia tomado os votos monásticos. A criança que ela teve foi concebida depois de uma visão meditativa que a deixou encantada, porém também atônita. Estava envergonhada e, temendo que as pessoas pensassem mai dela ou acreditassem que a criança era um fantasma porque havia nascido de uma virgem, o escondeu em forno com brasas dos que se utilizavam para queimar madeira a fim de produzir carvão. Quando, cheia de remorsos, regressou alguns dias depois, encontrou a criança radiante e saudável brincando nas cinzas. Desde então aceitou-se que a criança era uma encarnação milagrosa de um grande mestre e, em conseqüencia, foi educado no palácio do rei. Espontâneamente e sem que o ensinassem, como soubesse de memória, começou a recitar tantras essenciais a partir de sua grande claridade, e o rei achou tão prazerosa sua companhia que o chamou Praharsha Vajra, que na língua de Örguien (que era sinilar ao sânscrito) significa "Vajra Prazeroso". Este nome traduzido ao tibetano é "Garab Dorje". Com sete anos, quando os mais doutos pandits do reino se reuniram para um debate, Garab Dorje uniu-se a eles discutindo e mostrando uma compreensão muito superior à de seus interlucotores e derrotando-os fácilmente. Em continuação lhes transmitiu os ensinementos dzogchen. Assim pois, em pouco tempo de difundiu até terras muito afastadas a notícia de que opaís de Örguien, uma criança considerada como a reencarnação de um grande mestre estava ministrando um ensinamento que se encontrava além da lei de causa e efeito. Quando a notícia chegou a Índia, os pandits budistas deste país se sentiram perturbados e decidiram que o mais sábio entre eles – que resultou ser Majushrimitra, um grande especialista em lógica e debate – deveria dirigir um grupo que visitaria o descarado, desavergonhado e presunçoso joven e o derrotaria em debate. Muito bem, quando Majushrimitra enfrentou o garoto, não pode encontrar erro algum em seu ensinamento e se fez evidente que a realização deste ia muito além de sua própria compreenção intelectual e que se tratava na verdade de um grande mestre. Então se arrependeu profundamente e confessou a Garab Dorje a motivação errônea que havia tido ao vir ve-lo, a única intenção era derrotá-lo em debate. Garab Dorje perdoou Majushrimitra – o maior dos eruditos budistas de seu tempo - e procedeu a dar-lhe mais ensinamentos, pedindo-lhe em troca que escrevesse um texto colocando o raciocínio com que Garab Dorje o havia derrotado. O texto que Majushrimitra escreveu então existe ainda em nosso dias. Ainda que, na medida em que se apresentava como um ensinamento que se encontrava além da lei fundamental do cárma ou "causa e efeito", o ensinamento de Garab Dorje parecia contradizer o dharma budista, na verdade estava em perfeito acordo com as mais altas expressões deste. Com efeito, o famoso sutra Prajnaparamita hridaya, que constitui o resumo essencial dos vastos sutras do Prajnaparamita, ilustra o princípio do shunyata ou "vacuidade de auto-natureza" – a ausência de existência intrínseca e independente que postula o budismo – enumerando os principais elementos com os quais construimos nossa realidade e declarando que cada um deles é vazio. Assim pois, o sutra afirma a vacuidade das funções sensoriais e seus objetos, afirmando que o olho carece de existência independente e que, da mesma maneira, "entes" tais como "ouvído", o "nariz", as faculdades de ver, ouvir e de cheirar, e assim sucessivamente, não existem na verdade, de maneira intrínseca. Em continuação o texto nega a auto-existência dos elementos centrais dos ensinamentos do Budha e, ao faze-lo, declara – em perfeito acordo com Garab Dorje - que desde o ponto de vista do vazio não há cárma nem lei de causa e efeito. O sutra nos diz que, frente a uma multidão de seres de várias espécies, o Budha mesmo pediu ao grande bodisatva Avalokiteshvara que transmitisse esse ensinamento ao grande arhant Shariputra. Ao final do sutra, Shakyamuni elogia muito a sabedoria expressa pelas palavras de Avalokiteshvara e diz que ao escutá-las todos se regozijaram. Em conseqüencia, não cabe dúvida de que no coração mesmo dos ensinamentos do Budha há um ensinamento além da relação causa-efeito e de qualquer limite. Garab Dorje continuou ensinando durante o resto de sua vida e teve muitos discípulos, tanto entre os seres humanos como entre as dakinis. Finalmente, antes de que seu corpo se dissolvesse na essência dos elementos e entrasse na manifestação do Corpo Luz, deixou o resumo de seus ensinamentos, conhecido como os "Três Princípios". |