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Sem mais questões por Tam Huyen Van
Janeiro, 2006 Ano Buddhista 2549. Ao encontrar um mestre Zen em um evento social, um psiquiatra decidiu colocar-lhe uma questão que sempre esteve em sua mente: "Exatamente como você ajuda as pessoas?" ele perguntou. "Eu as alcanço naquele momento mais difícil, quando elas não tem mais nenhuma questão para perguntar", o mestre respondeu. E então chegamos à maturidade, continuando a buscar respostas. Mas não buscamos verdades, realmente. As respostas que queremos são forjadas pelas expectativas que temos, e fundamentadas nas convicções de abrigamos em nossas mentes. Portanto, diante das questões fundamentais cada pessoa anseia pela resposta mais conveniente, pelo esclarecimento mais sedutor. As questões se acumulam enquanto vivemos a vida descuidadamente, sem consciência do mais que ela apresenta. As dúvidas, as incertezas, e o grande medo de descobrir amargas verdades: eis os aspectos mais pungentes do grave processo de maturidade perceptiva que as mentes de todos nós vivenciam ao longo dos caminhos e dias humanos. A falta de respostas coerentes para questões viscerais é o que permite tanta ignorância no mundo. Pois cada indivíduo humano, seja o que vive em aldeias do Afeganistão ou passeia nas ruas de New York, passa em determinado momento pela grave certeza de que não há mais sentido continuar questionando, e abriga no coração a convicção de que as respostas convenientes são as mais confiáveis, justamente porque estão sempre disponíveis e sempre imediatas, atendendo às condições de cultura ou conhecimento nos são impostas. Poucos são aqueles que, neste momento mais difícil, tem a oportunidade de ouvir palavras fundamentais de cura, sabedoria e liberdade. Palavras de alerta, que ajudem a nos retirar de um caminho monótono, fanático ou superficial, sem sabedoria. Eis a função do professor de Dharma: estar disponível no momento crucial (e para a maioria disfarçado, inconsciente) de desarvoramento, de falta de perspectivas saudáveis e coerentes. Os acontecimentos mundiais da atualidade são exemplos claros do grau de desnorteamento sob o qual a esmagadora maioria da humanidade vive. Existe um vácuo de compreensão e entendimento, e o ódio ignorante se torna cada vez mais evidente. Em quê momento a humanidade perdeu-se tanto em si mesma? Mesmo o esforço realizado por alguns grandes pensadores contemporâneos para que o exercício do diálogo entres os povos seja feito sob um novo prisma (que não seja mais baseado em premissas formais ou friamente diplomáticas, mas conscientes e honestas) choca-se com a grande dificuldade de reconhecimento de nossas limitações de percepção e entendimento mútuo. Ao contrário do que imaginavam algumas abordagens sociais e psicológicas, o grande embate comunicativo moderno não ocorre entre as mentes oriental e ocidental, mas entre as posturas radicais e liberais. Abandonou-se completamente a busca pelas respostas sábias, as questões fundamentais deixaram de ter importância e em seu lugar são as dúvidas desnecessárias e absurdas que dominam mentes e corações; estamos decepcionados com os mistérios (eles se perderam em meio à metodologia científica) e insensíveis ao que é simples. A humanidade passa pelo seu momento mais difícil, desnorteada e cansada de questionar saudavelmente. Observe bem à sua volta (observe bem você mesmo), muito poucos são os que sabem reconhecer quais são as perguntas que precisam ser respondidas, e mais do que isso, o excesso de intelectualismo e o fluxo assustador de conhecimentos aleatórios criaram um cenário de banalidades, erudições frias, esoterismos e contradições. A juventude cresce em meio ao caos argumentativo e ao vazio de relações simbólicas sadias com o universo existencial, o que por sua vez forja adultos superficiais e intolerantes, e toda palavra a favor do exercício de consciência corre o risco de ser menosprezada como uma tola tentativa de falar ao deserto. Mas é precisamente neste momento que torna-se importante defender a prática contemplativa e reflexiva, e buscar por todos os meios argumentos a favor da superação das contradições culturais que destroem as possibilidades humanas de equilíbrio e tolerância. É precisamente neste momento que atua o Zen: reafirmando a sabedoria de que é possível superar o medo e o desarvoramento. Quando não temos mais nada a questionar, abrimos margem para que as reais dúvidas apareçam. Embora o caminho para a maturidade de consciência seja longo, e grande parcela da humanidade esteja profundamente mergulhada em ódios, orgulhos e negações, a prática ainda é possível. Nunca se esqueça disso: preconceitos, extremismos e ignorâncias jamais superam a perspectiva construtiva que habita o espírito humano; apenas criam uma ilusão de domínio da intolerância. A doença perceptiva de que sofre o Homem é perigosa e destrutiva, mas há uma medicina para isso; a cura é possível, e completamente viável para todos nós. Colaboração de Claudio Miklos |