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As bombas
Texto de Thich Nhat Hanh,
extraído do livro"Flamboyant em chamas"

T’ô ouviu vozes de crianças e de adultos, apelos patéticos. De repente, houve uma terrível explosão em direção à praça do mercado. Tremeu a terra. Destroços caíram por todo lado e T’ô sentiu-se coberta de sujeiras, embora as crianças estivessem abrigadas debaixo dos grandes galhos floridos do flamboyant. Ouviu, então, gritos trágicos, gritos de dor, e deu-se conta de que um obus tinha caído no meio do mercado, ferindo e até mesmo matando gente. Logo após, na direção oposta, além da feira, começou o canhonaço.

T’ô urrou: — Oh, Mamãe, onde está você?

A mãe havia ido à loja de óleo situada no centro do mercado. O pensamento de que a mãe podia estar morta atravessou seu espírito como um uivo. Começou a tremer e, em pânico, apertou estreitamente Thach Lang contra ela. Porém, Thach Lang endireitou-se e disse:

— Não grite e nem chore assim. Você vai ficar sentada aqui e eu vou procurá-la. Eu vou encontrá-la.

Mas enquanto se levantava, as balas começaram a assobiar bem acima da cabeça deles e outra terrível explosão sacudiu o mercado. T’ô empurrou rapidamente Thach Lang e novamente caíram de bruços na poeira. Parecia que a segunda explosão tinha sido mais violenta ainda do que a primeira. Baforadas de ar quente atingiram-nos como tempestade de fogo e ouviram coisas desmoronarem. Pó, sujeiras, destroços choviam na praça toda. Depois houve um momento de calma. Em seguida, recomeçaram tumulto e gritos. Os ruídos das pessoas correndo e gritando aproximaram-se cada vez mais. No pequeno quartel do governo os canhões estavam agora silenciosos.

As duas crianças jaziam como duas achas de lenha. Em seguida, T’ô ouviu barulhos secos, estalidos e, ao longe, como um temporal. Thach Lang disse que as pessoas estavam incendiando as casas dos dois lados do mercado e que o fogo estava feroz. Disse também que havia agora vários homens, carregando fuzis, reunindo-se em grupinhos.

As crianças permaneceram um longo momento imóveis. Agora, ouviam apenas o crepitar do fogo, a explosão dos esteios das casas de bambu e o uivo das chamas. As vezes, havia os gritos e os gemidos dos feridos.

Thach Lang disse:

— Muitas pessoas estão feridas, vamos ajudá-las o melhor que pudermos.

T’ô apertou o braço de Thach Lang com mais força:

— Não, por favor. Espie se os homens com fuzis ainda estão aqui.

— Todos partiram. Agora, no mercado, só devem ter ficado os feridos. Eles não podem fugir.

As crianças abriram caminho para si até um grupo de vítimas prostradas no chão. Meia dúzia de aldeões saíram de seus abrigos. Tentavam socorrer os outros. Improvisaram macas com pedaços de bambu para transportar feridos à enfermaria da Aldeia. Thach Lang contou a T’ô que pessoas haviam perdido braços e mãos. Alguns tinham pés esmagados. Outros, o rosto arrancado. Criancinhas jaziam em enormes poças de sangue.

Pessoas fugiam cada vez mais da Aldeia. Havia agora aproximadamente vinte pessoas. Enquanto os aldeões carregavam mortos e feridos, as duas crianças iam caminhando à procura da mãe. Thach Lang guiou T’ô a um lugar onde lembrava ser a loja de óleo. Essa loja não estava mais ali. Em seu lugar havia um monte de cinzas incandescentes.




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