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CINCO MANEIRAS DE SER VERDADEIRO PELA PRÁTICA DO DZOGCHEN
 

Lama Surya Das
Extrato do livro: ÉVEILLEZ VOTRE SPIRITUALITÉ
As sabedorias orientais do cotidiano
[págs 364-369]
Tradução ao português: Karma Tenpa Dhargye


Natural e simples

Repousemos sobre o nosso estado natural. Sejamos nós mesmos, nosso ser intacto. Eis uma instrução meditativa a transportar conosco: tudo que necessitamos encontra-se na mente natural, primordialmente íntegra e total.

Autenticidade, retidão, sinceridade

Uma paz nirvânica reside no que é deixado tal como é. Luta e encarniçamento revelam-se aqui supérfluos. Não toque em nada, e permaneça de coração e mente serenos e vigilantes. Observe além do objeto, seja o objeto, e permaneça livre, luminoso e intacto.

Abertura e unicidade

Mantenha a mente aberta, permaneça receptivo. A pura presença é ausência de prejulgamentos, é um estado de consciência de neutralidade, de não-intervenção, de atenção globalizada no ser e no instante. Permaneça aberto a sua experiência. Deixe as coisas tomarem por si mesmas o seu lugar. Qualquer que seja ele, talvez seja o melhor.

Consciência e sabedoria

Uma consciência desperta sabe e vê as coisas como elas são. Nossa lucidez inata é eficiente e sábia por natureza, capaz de discernir o que é sensato e o que não é.

Energia ou fluxo espontâneo

Uma mente livre e tranqüila favorece o relaxamento e o ressurgir das energias inesgotáveis e não reprimidas. Abandonando, renunciando aos nossos modelos repetitivos e alienantes, flutuamos para tornarmo-nos unos com a corrente. É a onda natural, a zona sagrada evocada pelos mestres. Podemos acessar isso à vontade.

Guardem esses princípios na memória praticando os exercícios de meditação natural em seguida. Lembrem-se de aplica-los também em suas vidas cotidianas que é a meditação natural por excelência. Os mestres zen chamam isso de "genjo-koan", a experiência de por em prática no plano cotidiano. É nisso que reside o ser de sabedoria e de amor do Budha.

Meditação Dzogchen para a contemplação celeste

Quando crianças, mesmo antes que a palavra meditação chegasse aos nossos ouvidos, todos na maior parte, observamos o céu, deitados na relva ou sobre um rochedo. Éramos todos despertos ou estávamos no paraíso? Quem sabe... Nada impede que esses preciosos instantes restem gravados em nossa memória, mesmo se, em nossa mente, nada estivesse ainda definido. Os problemas teológicos não faziam parte de nossas preocupações, não mais que nossa consciência ou nossos meios de relaxamento. Provavelmente não tínhamos nada do que fugir ou evitar; não éramos mais que crianças que sonhavam senão em se divertir, despertando para a vida e para a luz sem o menor embaraço, naturalmente tranqüilos. Constantemente ou não, estávamos voltando a nossa verdadeira natureza, esta natureza búdhica que é nossa, o nirvana que dorme em cada um de nós.

Se esses instantes estão ainda presentes e claramente acessíveis em nossa memória, dominemos a partir de agora a prática Dzogchen da contemplação celeste. É bastante então instalar-nos em nossa espreguiçadeira na grama ou no terraço de nossa casa.

Por que a prática da meditação celeste induz com efeito a observar o espaço, como uma criança contempla o céu. É uma maneira de liberar nossa mente dos conceitos, de nossas dúvidas e de nossas hesitações. Tudo que nos pedem, é estarmos felizes no lugar e no instante no qual vivemos. Um céu azul não é nem mesmo necessário, a abóbada estrelada e seus espaços infinitos serão muito favoráveis ao abandono. Aqueles que leram O Pequeno Príncipe se recordarão da criança escutando as estrelas tilintando como sininhos sobre a imensidão do Saara. A meditação pela contemplação do céu torna-se então meditação para a contemplação das estrelas; o que há de mais natural para o pequeno Budha que reside em cada um de nós? Sejamos a criança de coração aberto. Observemos o céu e deixemo-nos ir. Ofereçamos nossos pensamentos e nossos sentimentos às estrelas. Lancemos aos céus nossos olhares e aos ventos nossa confusão.

Da maneira mais convencional, a meditação Dzogchen pela contemplação celeste se pratica na posição sentada.

Instalem-se confortavelmente.

Façam algumas respirações e relaxem-se..

Estejam presentes, receptivos, disponíveis.

Não há nada que tenham que fazer, nenhum lugar onde devam estar, nada que tenham que conceber ou realizar.

Sejam tão naturais como uma criança deixando-se cair sobre a relva.

Acalmem sua mente.

Deixem-se repousar na consciência e na simplicidade.

Após uma profunda inspiração, vocalizem: ‘Ahhh’

Inspirem novamente.

Depois vocalizem enquanto expiram: ‘Ahhh, ahhh’.

Deixem esse ‘Ahhh’ transportar vocês além de vocês mesmos. ‘Ahhh’.

Projetem suas mentes. ‘Ahhh’.

Levantem os olhos.

Elevem o alcance de sua consciência luminosa

Até que ela forme uma esfera completa.

Sejam atentos. Estejam presentes.

Permaneçam em seu estado natural de presença e despertar espiritual.

Como uma criança deitada na relva e que olha passar as nuvens, deixem todas as coisas desfilarem nos céus, como a natureza da mente infinita do Budha.

Permaneçam na totalidade celeste da natureza da mente, onde tudo encontrará seu lugar, que virá momentaneamente ao corpo e a mente.

Sem entraves, a dança sagrada do fenômeno e do noumeno parece flutuar em um divino desfile.

Apreciem o desfile do Dharmakaya, realidade absoluta.

Observem o processo pascoal em suas mentes

Desfilando como as vagas no mar,

E aproveitem o espetáculo.

Há lugar para todas as coisas.

A meditação natural do Dzogchen é às vezes entendida como uma não-meditação, por que é freqüentemente desprovida de forma e de constrangimento. O Dzogchen sublinha o fato de que todos os constituintes do Caminho podem ser abordados sob uma forma contemplativa, reconhecendo neles o jogo divino da mente búdhica, a realidade absoluta.

Para praticar a meditação pela contemplação celeste, não é realmente necessário observar o céu. Esse espaço nos é sempre acessível fechando simplesmente os olhos, ao observar a luz que surge do fundo de nossos olhos. Podemos nos fundir neste espaço que não é outro senão o reflexo puro, luminoso e aberto da natureza da mente.

Os adeptos do Dzogchen dedicam-se a estas práticas durante horas, mas é também válido faze-las durante alguns instantes, nem que seja por um minuto. A questão que se coloca, é saber qual o tempo requerido para entrar em contato com nosso infinito interior, para acessar a Visão, a grande imagem englobante. Ora, para isso, é sempre possível usar os mesmos princípios da meditação Dzogchen e aplicá-los sobre uma variada gama de meditações naturais. Podemos, por exemplo, praticar a contemplação da terra, do fogo, da água e mesmo do vento. Quem dentre nós não se deixou fascinar pelas chamas de uma acha de lenha consumindo-se numa lareira? A experiência pode revelar-se calmante, reconfortante, tanto como esclarecedora e regeneradora.

Pessoalmente, gosto de meditar à beira do oceano, deixar meus pensamentos desenrolarem-se ao ritmo das vagas. O som do oceano é tão regular que não faço nenhum esforço para minha respiração acalmar-se. Para a prática da contemplação terrestre, podemos também observar as vastas extensões com um sentimento de infinito no qual teremos o sentimento de nos perder. Desertos, montanhas, gargantas e florestas são portanto lugares que nos conduzem à contemplação terrestre. A intenção reside na descoberta de espaços graças aos quais nos é possível projetar nossa mente para o incomensurável, de maneira que nossa natureza egoísta seja investida de um sentimento de infinito e de sagrado. O fogo consome tudo; o oceano engole tudo; e o furacão carrega tudo. Os fenômenos terrestres nos dão a impressão de derrisão e de insignificância. Nós somos muito pouca coisa ao olhar para os quatro elementos que são a água, o ar, a terra e o fogo. Entretanto, não é absolutamente necessário basear-nos nos fenômenos naturais para conduzir-nos à meditação; basta um lugar que desperte em nós admiração e respeito. Observar um arranha-céu, o Parthenon, a torre Eiffel, a Golden Gate ou a pirâmide de Queóps conseguirá também o mesmo processo. Por que todo monumento natural ou artificial, pode muito bem conduzir-nos à meditação, na medida em que os sentimentos que eles tenham inspirado forem suficientes para projeta-nos além de nós mesmos.

Durante a prática desta meditação Dzogchen, teremos o cuidado de respirar regularmente, em um ritmo natural, e deixar esta impressão de infinito comandar a nossa finitude. Esses encontros com a imensidão contribuem para conduzir-nos à realidade; eles podem também ajudar-nos a estabelecer o contato com ela, e abrir-nos a nossa budheidade natural.

No infinito, é preciso também ver o infinitamente pequeno. Adquiri esse mesmo sentimento, pelo fato do respeito e do maravilhar-me, diante das menores criaturas, esses milhões de seres invisíveis que, sob o microscópio, apresentam-se em uma gota d’água.

Henry Wadsworth Longfellow disse-o muito bem nessas linhas; e se houver um conselho a seguir para a meditação natural, é exatamente este:

Instalai-vos em vosso devaneio e observai

As cores mutantes das vagas quebrando-se

Sobre a praia ideal de vossa mente.




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