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O Caminho do Meio por Tulku Thondup Rinpoche Do livro "Hidden Teachings of Tibet" Este é um breve contorno da filosofia Mahayana de acordo com a escola Prasangika Madhyamika. Os eruditos e escolas tibetanos variam em suas interpretações sobre a visão Prasangika. A seguinte é um sumário do ponto de vista de Longchen Rabjam (1308-1363), o maior erudito da escola Nyingma, exposto no Yidshin Dzodrel Pema Karpo. Um entendimento completo da filosofia Prasangika requer familiaridade com os textos originais e com as visões contrastantes da erudição interpretativa. No Prasangika, os proponentes não aceitam ou apresentam, como as outras escolas fazem, qualquer teoria em qualquer dos quatro modos, conhecidos como as quatro alternativas de existência: [1] "é", [2] "não é", [3] tanto "é" quanto "não é", [4] não "é" nem "não é". Tomar uma posição ou apresentar uma teoria que caia sob um dos quatro modos é comprometer-se e apegar-se àquela teoria. Isto causa pontos de vista contraditórios e produz uma teoria que tem o defeito de precisar ser defendida. Os prasangikas simplesmente demolem e rejeitam as teorias dos outros. As principais teorias a serem demolidas são aquelas que mantém uma ou outra das visões extremas do substancialismo e do niilismo. O substancialismo [ou eternalismo] afirma a existência de uma entidade universal que gera os fenômenos. O niilismo nega a existência de tal substância subjacente. O método dos prasangikas é expor as conseqüências das visões dos outros sem apresentar qualquer visão própria. Nagarjuna diz em seu Vigrahavyavartanikarika: Se eu tivesse apresentado qualquer teoria, Esta filosofia deve ser entendida através da introdução de duas categorias: a natureza absoluta e o nível convencional. A natureza absoluta Na natureza absoluta [ou última], não há divisão entre a verdade relativa e a verdade absoluta. Esta divisão é feita apenas no nível relativo ou convencional. No nível absoluto não há duas verdades. Mas o relativo e o absoluto aplicam-se apenas um em relação ao outro. Então, quando a divisão é feita, a verdade é vista como inqualificável mesmo como absoluta. Porém, o "absoluto" também pode basear-se em si mesmo, sendo usado para a natureza não-diferenciada da verdade. O significado absoluto é o estado meditativo de uma pessoa realizada, o estado iluminado de um Buddha, e a natureza absoluta de todos os fenômenos existentes. A verdade relativa ou aspecto convencional é a realidade percebida pela mente deludida. É o objeto da mente e dos sentidos de uma pessoa comum. O aspecto absoluto é a realização da sabedoria da consciência diferenciadora. Nenhum aspecto possui qualquer realidade essencial, pois os objetos da mente e dos sentidos são percepções deludidas, adventícias, ao invés de serem essencialmente reais, enquanto a consciência diferenciadora da mente de sabedoria realiza a vacuidade dos seres e dos fenômenos, sua irrealidade essencial. Ambos os aspectos da verdade são ditos como livres dos extremos da elaboração e do julgamento, porque se há elaboração nos fatores e qualificações, o que é percebido torna-se um dos extremos da existência - é, não é, ambos e nenhum. No significado absoluto não há surgimento, permanência ou cessação dos fenômenos. Desde o próprio momento do surgimento, eles são vazios de essência ou realidade, como as aparências em um reflexo. Não há existência nem não-existência neles, e nada há a aceitar e nenhum aceitador de qualquer existência. Nada é surgido ou nascido de qualquer uma das quatro causas possíveis de surgimento: [1] de si mesmo, [2] dos outros, [3] de ambos, ou [4] da ausência de uma causa. Já que não há surgimento de fenômenos, eles não cessam ou permanecem na existência. Nagarjuna disse no Mulamadhyamikakarika I: Os fenômenos não surgem de si mesmos, dos outros A natureza absoluta é a de não existir em qualquer forma. Transcendendo os objetos da mente dualista, está a indivisibilidade das duas verdades e da liberdade primordial. Os prasangikas, portanto, não apresentam qualquer teoria que diferencia. O nível convencional No nível convencional, três aspectos são distinguidos a fim de ilustrar a visão, o caminho e a meta filosóficos do treinamento espiritual: eles são chamados de base, caminho e resultado. A base A visão filosófica das duas verdades é a base. Na visão filosófica do nível convencional, os seres fenomenais são divididos em duas verdades, a verdade relativa e a verdade absoluta. Nagarjuna disse no Mulamadhyamikakarika XIV: Os ensinamentos expostos pelos Buddhas A verdade relativa A verdade relativa é o objeto do ordinário, ou seja, da mente deludida e das faculdades sensoriais deludidas. Manifestando-se como uma aparição, ela não tem essência ou verdade, mas é verdadeira enquanto preencher um certo papel para a mente deludida. A verdade relativa é o aspecto inteiro das aparências diante da mente, junto com o apego a elas como verdadeiras. Já que elas não têm essência, os fenômenos não existem como verdadeiros ou falsos, como delusão ou não-delusão, mas sim porque a mente identificou os objetos, dizendo, isto é uma faculdade, estes são os sentidos, e esta é uma casa; e ela diferencia e se apega a eles como sujeito e o objeto. O aspecto objetivo deste modo mental é chamado verdade relativa. A verdade relativa é caracterizada pelos fenômenos que estão circunscritos como objetos mentais e que não resistem à análise. Todos os fenômenos existentes são originados através da causação interdependente. Os fenômenos que não existem mas que são presumidos como existentes, ou que são falsamente apreendidos pela mente, são contrastados com os fenômenos existentes. As entidades surgem através da causação interdependente. As não-entidades surgem através da operação da mente, similares ao nexo causal dos fenômenos objetivos, conhecido como a postulação interdependente. Os pensamentos, idéias e percepções delusórios - por exemplo, a corda que é confundida com uma cobra - são produtos da postulação interdependente. A verdade absoluta A verdade absoluta é a liberdade em relação a todas as elaborações e julgamentos, e é o objeto da sabedoria da auto-consciência diferenciadora. Esta sabedoria é o insight não-deludido que transcende a expressão e os conceitos. O Buddha disse: A sabedoria transcendente está além da concepção e além da expressão, Esta auto-consciência não é a mesma que a da escola Mente Apenas (Chitamatrin), que a usa como um termo para a mente comum. A verdade absoluta não é um objeto da mente. A verdade absoluta não é um objeto da mente; A verdade absoluta é a meta última do treinamento espiritual; e é verdadeira como o caminho e resultado do treinamento e realização espirituais. A verdade absoluta é a grande paz, a cessação, a natureza das coisas, que transcende os objetos da mente. Em seu sentido real, tanto as identidades das coisas quanto da natureza das coisas são igualmente puras, livres e perfeitas, e estão além das elaborações ou julgamentos. Estão afastadas das referências mentais e das referências características. As pessoas que realizam as duas verdades aperfeiçoam o caminho das acumulações duais e atingem o estado búddhico. Chandrakirti disse em seu Madhyamakavaratara VI: O rei dos gansos, com as bem desenvolvidas asas brancas Do ponto de vista buddhista, para algo ser real, ele não deve depender de qualquer outra coisa além de si mesmo para a sua existência. Sua identidade não deve ser dependente do surgimento de qualquer outra coisa. Já que todos os fenômenos foram demonstrados como surgidos através de um processo de causação interdependente, a conclusão é que as coisas não têm "ser próprio" [existência inerente]. Esta ausência de identidade real é a sua natureza, e é chamada vacuidade. As duas verdades são as coisas e a natureza das coisas. Elas nunca são encontradas separadamente. Elas são vacuidade porque são um surgimento interdependente, ao invés de serem independentemente reais. Se fossem reais, não haveria surgimento e cessação. Os fenômenos surgidos funcionam interdependentemente porque são vacuidade. Se não fossem vacuidade e irreais, nada poderia surgir, cessar ou funcionar através da originação dependente. Nagarjuna disse no Vigravyavartanikarika: Os fenômenos que surgiram interdependentemente Ambas as verdades são livres da realidade. Então não são nem eternas nem nulas. Quem quer que entenda o significado da vacuidade entenderá a lei do surgimento interdependente como, por exemplo, o princípio cármico. No Caminho do Meio, as duas verdades são a mesma [verdade], e essa verdade é o ensinamento do Buddha. No Vigravyavartanikarika é dito: Para quem quer que a vacuidade seja possível, Sem conhecer o significado das verdades, é impossível entender e realizar os ensinamentos buddhistas. Sem contar com o nível convencional não há como expressar, entender e realizar o significado absoluto a fim de atingir o nirvana. Quem quer que não conheça as duas verdades Na verdade absoluta, não há distinção entre a afirmação e a negação. Porém, estas divisões são mantidas na verdade relativa: quando engajado tanto no debate quando na contemplação da natureza última, não se mantém qualquer tese ou se apresenta qualquer visão, já que a natureza última é livre de manter ou apresentar qualquer visão. Quando estiver em um período de não-meditação ou quando lidar com o mundo convencional, deve-se ver, ponderar e ensinar aos outros os detalhes dos fenômenos existentes da verdade relativa como foi dado nas escrituras, isto é, que eles são como um sonho ou como uma aparição. Este reconhecimento da natureza das coisas, que são como um sonho, abrirá os olhos para caminho das duas acumulações e então se deverá atingir os dois corpos - o corpo último e o corpo da forma – do estado iluminado, o estado búddhico. O caminho O caminho é a via do treinamento espiritual nas duas acumulações. Há dois processos de acumulação a fim de atingir a meta: a acumulação de mérito e a acumulação de sabedoria. É necessário completar a dupla acumulação fim de realizar a vacuidade e então atingir os resultado dúplice, os dois corpos de um Buddha. Nagarjuna diz no Yuktishashtikakarika: Pelos méritos de [ter escrito] este [texto], possam todos os seres O mérito Mérito é o treinamento espiritual nos meios hábeis baseado na visão da verdade relativa. É o treinamento nas seis perfeições, isso é, generosidade, disciplina, paciência, diligência, contemplação [ou concentração, meditação] e sabedoria. A sabedoria Sabedoria é o treinamento baseado no entendimento da visão da verdade absoluta. É a meditação sobre o insight da sabedoria, livre da elaboração, e a cessação da mente e dos eventos mentais. O Buddha disse no Asthahasrika: Ó Subhuti! As mentes são luminosas em sua natureza. No Ratnavali é dito: O corpo da forma dos buddhas Primeiro deve-se alcançar o ponto de entender a liberdade em relação às conceitualizações através do raciocínio e de ver a ausência de realidade, que é a natureza de vacuidade dos fenômenos existentes. Examine uma flor, por exemplo: tente encontrar e provar como a flor existe. A flor é a cor da flor, ou é o seu formato? Não, eles são a cor e o formato, mas não a flor. As diferentes substâncias são a flor? Não. Não descobriremos a flor mesmo se a reduzirmos às suas menores partículas. Não podemos achá-la nas partes da flor, não pode ser encontrada na agregação dessas partes, incluindo a cor, o formato e as substâncias. Então não há qualquer coisa na flor que possamos identificar como a sua existência1. Ao invés disso, o que foi provado é a sua não-existência, o não-eu e a vacuidade da flor em sua natureza real. O mesmo método de exame é aplicável a todas as formas da matéria - até as menores partículas - e para a mente - até o seu mais curto momento de duração. Portanto, a forma e os outros constituintes da existência são vacuidade. Como os fenômenos parecem ser reais e funcionais? A base é a vacuidade. Os fenômenos surgem e funcionam como reais quando percebidos por pessoas comuns como nós. O processo de emergência da vacuidade para a realidade aparente toma lugar através da interdependência do aspecto objetivo, que são as causas e condições, e do aspecto subjetivo, que são o pensamento dualista, as emoções maculadas [emoções perturbadoras] e o processo cármico enraizado na ignorância. Os fenômenos existentes surgem quando os fatores causais estão completos. O exemplo dado é o de um mágico criando uma ilusão. Quando os mantras, as substâncias e a meditação forem completados, as casas e as árvores criadas pelo poder mágico aparecerão como irreais. Do mesmo modo, a vacuidade é forma e assim por diante. Como resultado do surgimento dependente da existência fenomenal, os fenômenos são irreais e são vacuidade em sua natureza verdadeira. E como eles são vacuidade, são capazes de surgir e funcionar através do surgimento dependente. Similarmente, o espaço permite que a terra e os seres funcionem. Apesar de as aparências fenomenais não serem verdadeiras em sua natureza real, elas aparecem e funcionam como verdadeiras no nível relativo, que é a falsidade. A visão extrema do substancialismo é evitada ao entender as aparências. Enquanto parece ter um "ser", a flor é uma vacuidade, uma não-existência. A visão extrema do niilismo é evitada ao entender a vacuidade. A vacuidade é capaz de surgir como uma originação dependente. A vacuidade e a originação dependente são inseparáveis. Portanto, a vacuidade não é outra que a forma e a forma não é outra que a vacuidade. O Sutra do Coração diz: A forma é vacuidade, a vacuidade é forma, Quando se treina nesta contemplação de sabedoria, primeiro deve-se acalmar a mente e então deve-se permanecer experiencialmente no estado de liberdade em relação aos pensamentos, referidos como a visão da verdade absoluta. Enquanto se permanece nesse estado, os conceitos de objetos exteriores e de mente interior param de ser gerados. A dualidade do objetivo e do subjetivo é superada. Isto é a liberdade em relação aos conceitos e percepções duais. Nessa hora não há afirmação nem negação na mente engajada na contemplação, não há qualquer coisa além do insight livre das elaborações. É a meditação sobre a sabedoria luminosa da consciência auto-discriminadora. Shantideva disse no Bodhicharyavatara IX: Uma vez que nem as coisas nem as não-coisas As tendências que são as primeiras a cessar através da contemplação sobre a natureza dos fenômenos são: o apego sobre os fenômenos como reais; e as afirmações e negações. Então, depois, mesmo o apego à contemplação do estado natural das coisas também cessará. Para começar com a realização da vacuidade, venha conceitualmente através da inferência e então através de um insight direto, total e não-dualista. O Bodhicharyavatara IX diz: Desenvolvendo a experiência da vacuidade, Uma vez cessado o apego ao sentido de um eu e à realidade dos fenômenos, o próprio conceito de antídoto a estas delusões radicais cessarão. É o conceito de vacuidade dos fenômenos em si. Uma vez que ele tenha cessado, o meditador atingirá a sabedoria transcendente. Aquele que é livre dos vários conceitos e que desfruta da paz suprema A ignorância faz uma pessoa estar sujeita à originação dependente de causas e condições, a esfera da experiência mundana que não termina até a realização do estado absoluto, o estado búddhico. Antes desta realização da grande vacuidade ou da verdade absoluta, os efeitos do carma nunca são transcendidos. O caminho para ter uma vida mais feliz e para fazer os esforços que conduzem ao estado búddhico é praticar ações meritórias e a meditação que conduz à sabedoria. A fé, a generosidade, o amor e a conduta adequada pacificarão as forças negativas dentro de nós e gerarão a energia positiva, conduzindo-nos para o estado perfeito. A prática das ações meritórias e da sabedoria é possível por causa do padrão dinâmico da causação interdependente. O resultado O resultado são os dois corpos de um Buddha. Através do processo de treinamento no caminho, a mente e os eventos mentais, a causa do samsara, são dissolvidos na esfera última (sânsc. dharmadhatu). Na iluminação, para si mesmo atingi-se o corpo último (sânsc. dharmakaya). Para os outros, os corpos da forma (sânsc. rupakaya) aparecem espontaneamente, como um reflexo da lua na água, até que o samsara seja esvaziado. Eles aparecem de acordo com as aspirações feitas quando se treinava no caminho, e com as conexões cármicas dos seres. No Madhyamakavatara XI, é dito: A cessação [que resulta da] queima e O corpo da paz irradia-se como uma jóia que realiza desejos. No Bodhicharyavatara IX é dito: As árvores realizadoras de desejos e as jóias realizadoras de desejos Shantideva ilustra ainda mais o princípio das ações iluminadas, que realizam os desejos dos seres sem conceitos mentais e esforço, mas pelo poder das aspirações do passado. Ele conta a história de um brâmane chamado Shaku. Este brâmane abençoou um relicário de Garuda, uma divindade na forma de um pássaro sagrado. Mesmo após a morte do brâmane, por um longo tempo este relicário foi efetivo em neutralizar venenos. No Bodhicharyavatara IX é dito: Por exemplo, o relicário de Garuda que Nota: 1 - essência |